
Proposta cria regras para que produto seja considerado de origem natural
Redação
04 de março de 2019, 08:08
Em meio à pressão por mudança nas regras do setor, o total de agrotóxicos liberados para venda no mercado ou para uso in..
Natália Cancian - Folhapress - 05 de março de 2019, 08:45
Em meio à pressão por mudança nas regras do setor, o total de agrotóxicos liberados para venda no mercado ou para uso industrial têm crescido nos últimos anos.
Só em 2018 foram aprovados 450 registros desse tipo de produto, o maior número em ao menos 13 anos, de acordo com dados do Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Para comparação, em 2005, foram 91 registros, e em 2015, 139.
O avanço, que ganhou impulso nos últimos dois anos, no governo Michel Temer (MDB), tem chamado a atenção de especialistas, que veem a possibilidade de novo aumento na gestão Jair Bolsonaro (PSL).
Isso porque representantes do novo governo têm se posicionado de forma mais favorável às demandas do agronegócio e intensificado críticas a algumas políticas ambientais.
Nos dois primeiros meses deste ano, o governo aprovou o registro de 74 produtos ligados a agrotóxicos, pouco mais de um ao dia. Destes, 58 já tiveram o aval formalizado no Diário Oficial da União.
Hoje, a análise para liberação de agrotóxicos é dividida entre três órgãos: Agricultura, que avalia a eficácia dos produtos; Anvisa, que avalia a toxicidade; e Ibama, que analisa riscos ao ambiente.
Questionado, o Mapa diz que o aumento nos registros se deve a uma maior agilidade da Anvisa nas análises toxicológicas e que as recentes liberações não envolvem novos ingredientes ativos, mas produtos conhecidos do consumidor.
O ministério informa ainda que o aumento nos registros não indica um maior uso, mas novas opções para diferentes culturas.
Em nota, a Anvisa afirma que uma reorganização de processos de trabalho permitiu maior rapidez nas análises, mas que o volume de pedidos acumulados ainda inviabiliza que o prazo previsto em lei para registro, de até 120 dias, seja cumprido.
Já o Ibama atribui o recorde a pressões judiciais e a maior demanda das empresas por registro nos últimos anos. Só neste ano, em um mês, ao menos 31 novos pedidos foram incluídos na fila.
Comemorado por ruralistas, o aumento na liberação de produtos para venda no mercado preocupa movimentos que defendem maior rigor aos agrotóxicos.
Em 2018, o recorde no aval aos produtos ocorreu ao mesmo tempo em que um projeto que flexibiliza as regras de registro avançou no Congresso.
O texto, aprovado em comissão especial, tem sido alvo de críticas da Anvisa e do Ibama por retirar atribuições que hoje competem aos dois órgãos.
A comissão era presidida pela deputada federal Tereza Cristina (DEM), hoje ministra da Agricultura.
Em audiência no Senado na semana passada, ela voltou a defender mudanças na lei e rebateu críticas sobre o aumento na liberação dos produtos.
"Eles estavam estagnados, e agora a Anvisa resolveu trabalhar esse assunto, liberando aí várias moléculas nos últimos dois meses que estavam paradas em uma fila", afirmou.
"Era a grande reclamação: dez anos para se liberar uma molécula", disse Cristina.
O consultor da CNA (Confederação de Agricultura e Pecuária) Reginaldo Minaré diz que a pressão por mudanças na lei pode ter colaborado para o aumento nos registros. Para ele, no entanto, o processo ainda é lento.
Estimativas do Mapa apontam prazos de espera que variam de oito meses, para produtos biológicos, até cinco anos, para novas marcas de produtos já existentes no mercado, e dez anos, para novos ingredientes ativos.
"Há mais de uma década o setor vem enfrentando dificuldades no sistema de registro dos defensivos a nível internacional para que agrotóxicos altamente perigosos sejam retirados do mercado", diz Meirelles.
"O Brasil precisava efetivar substâncias de menor risco, e não as altamente perigosas." Ele cita como exemplo a atrazina, agrotóxico proibido na Europa, mas usado amplamente no Brasil.
Há outros produtos cuja liberação divide especialistas e membros do setor. É caso do sulfloxaflor, ingrediente ativo liberado no fim de 2018 e alvo de restrições recentes nos Estados Unidos por causa de seu potencial de impactar a população de abelhas.
Atualmente, tanto Anvisa quanto Ibama dizem priorizar a análise de pedidos de registro de produtos biológicos, considerados de menor toxicidade.
O problema, dizem os órgãos, é que a demanda para registro desses produtos ainda é baixa. Em 2018, de 450 registros, apenas 52 eram biológicos, ou cerca de 11%.
Para Meirelles, o ideal seria que houvesse mais critérios que priorizem o interesse público. "Por que vou registrar um produto classe 1, que é extremamente tóxico, se tenho outro que tem a mesma função e é classe 3?", compara.
"Enquanto na Europa se proíbe pulverização aérea e se fala em moratória para alguns produtos, aqui é libera geral", critica Fernando Carneiro, do grupo de trabalho de saúde e ambiente da Abrasco, para quem o país deveria investir em políticas de redução de agrotóxicos.