Deltan é convidado para ter função remunerada em partido após cassação

O Podemos convidou o deputado federal cassado Deltan Dallagnol (PR) para exercer uma função remunerada no partido, coordenando a formação de novos líderes políticos.

De acordo com a legenda, o valor do salário só será discutido após o ex-parlamentar decidir se aceita a proposta de trabalho.

Ex-coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, Deltan teve a cassação de seu mandato confirmada pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados na terça-feira (6), após o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ter determinado, por unanimidade, a perda do seu mandato parlamentar.

A ação de cassação decorre de representação da Federação Brasil da Esperança (PT, PC do B e PV) e do PMN.

Eles alegaram que Deltan não poderia ter deixado a carreira de procurador da República para entrar na política porque respondia a reclamações disciplinares, sindicância e pedido de providencias junto ao CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) –que fiscaliza os deveres funcionais dos integrantes do Ministério Público.

De acordo com integrantes da legenda, Deltan e a presidente do partido, Renata Abreu, conversaram sobre a proposta de trabalho ainda na noite de terça-feira.

Renata chegou ao gabinete de Deltan na Câmara poucos minutos depois da decisão da Mesa Diretora.

Na saída, afirmou à imprensa que tinha recebido a notícia com “muita tristeza”. Segundo ela, havia um entendimento entre aliados de Deltan que caberia à Mesa “também o julgamento da defesa”. “Mas a decisão foi tomada e agora é seguir em frente”, disse.

Como deputado, Deltan recebia salário mensal de R$ 44 mil, fora diversas outras verbas relacionadas ao mandato.

O Podemos também já chegou a ter entre seus quadros outro expoente da Lava Jato, o ex-juiz federal Sergio Moro, atualmente senador pela União Brasil do Paraná. Na época, Moro recebeu salário como dirigente partidário. O valor de seu contracheque era de R$ 21,7 mil (R$ 15 mil líquido).

Nesta quarta-feira (7), o ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal), determinou a diplomação de Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR) na Câmara, na vaga que era de Deltan.

Toffoli atendeu a um pedido do Podemos e com isso reverteu decisão do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Paraná, que havia destinado a vaga de Deltan para Itamar Paim, pastor de Paranaguá filiado ao PL, sigla do ex-presidente Jair Bolsonaro. 

Hauly é veterano na Câmara, já tendo sido deputado por sete mandatos.

Toffoli também indeferiu pedido de liminar feito por Deltan para que sua cassação fosse suspensa. O PL argumentou que a vaga de Deltan deveria ir para Paim porque Hauly não atingiu o quociente eleitoral mínimo. O pleito foi confirmado pela Justiça eleitoral do Paraná.

Toffoli entendeu diferente. O ministro do STF destacou que o TSE, ao cassar Deltan, autorizou a “preservação de seus votos à legenda” –no caso, o Podemos. Para ele, a cassação de Deltan após a eleição não pode ser motivo para desconsiderar os votos do partido.

Congresso banca até R$ 79 mil para ‘mudança fantasma’ de deputados e senadores

Congressistas estão recebendo neste início de ano verba que totaliza mais de R$ 40 milhões e que tem como justificativa uma situação que não encontra amparo na realidade.

Quase todos os 513 deputados federais e 27 senadores da legislatura que teve início no dia 1º, além dos que encerraram seus mandatos em 31 de janeiro, embolsaram ou embolsarão R$ 39,3 mil brutos a título de ajuda de custo para se mudar para Brasília ou para fazer o caminho inverso, de volta aos estados de origem.

Desse total, cinco senadores e cerca de 280 deputados federais reeleitos receberam ou receberão duas cotas da verba-mudança, uma pelo fim da legislatura passada e outra pelo início da atual, somando R$ 78,6 mil extras neste início de ano.

A verba-mudança é paga até mesmo para os deputados federais e senadores que foram eleitos pelo Distrito Federal.

Além de não haver nenhuma justificativa do fornecimento de auxílio-mudança para quem já mora na capital federal e para reeleitos, que trabalham e continuarão a trabalhar no Congresso, os demais casos -daqueles que de fato deixaram de ser congressistas e os que ingressaram na Câmara ou Senado pela primeira vez- também são questionáveis.

O Congresso já fornece aos parlamentares outras generosas cotas para custeio de passagens aéreas e hospedagem, entre outros gastos. Além disso, há muitas décadas não é mais comum deputados e senadores se mudarem em caráter permanente para a capital federal.

A verba, cujo nome oficial é Ajuda de Custo, está amparada atualmente no Decreto Legislativo 172/2022, que estabelece a destinação de um salário extra (R$ 39,3 mil) aos parlamentares no início e no final do mandato.

A origem do benefício, entretanto, remonta ao fim do Estado Novo. A Constituição de 1946 estabelecia uma ajuda de custo anual aos congressistas de todo o país em uma época em que o Rio de Janeiro era a capital federal e em que o transporte aéreo comercial ainda engatinhava.

Com isso, congressistas receberam pelas décadas seguintes uma espécie de 14º e 15º salários a cada ano para “compensar as despesas com mudança e transporte” para a capital federal.

Em 2013, uma articulação comandada pelo então presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (MDB-RN), acabou por aprovar proposta da então senadora Gleisi Hoffmann (PR), hoje presidente do PT, o que limitou a ajuda de custo ao início e ao fim do mandato -de quatro anos na Câmara e de oito, no Senado.

Desde então, alguns parlamentares apresentaram projetos para acabar de vez com a verba ou para proibir o pagamento aos reeleitos, mas nada andou.

Câmara e Senado programaram 1.080 cotas da verba-mudança neste início do ano (relativos ao fim da legislatura passada e ao início da atual), ao custo de mais de R$ 40 milhões.

As duas Casas transferiram para as contas dos parlamentares no dia 31 de janeiro os R$ 39,3 mil brutos relativos à legislatura passada.

O Senado pagou no último dia 2 os R$ 39,3 mil da legislatura atual para os 27 novos integrantes da Casa (só um terço das cadeiras do Senado entrou em disputa em 2022). A Câmara pagaria a outra cota de R$ 39,3 mil na próxima terça-feira (28).

Estão na lista dos reeleitos que vão embolsar quase R$ 80 mil extras parlamentares de todas as correntes ideológicas, como Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, o líder do centrão e presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o líder da bancada do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR).

A Câmara e o Senado custeiam passagens aéreas de deputados e assessores por meio de outra verba, o que permite com folga que eles viajem a Brasília e voltem aos seus estados semanalmente.

O chamado cotão direciona a cada parlamentar uma média de R$ 45 mil ao mês para esses gastos, além de um reembolso extra mensal de quatro bilhetes aéreos de ida e volta.

Quando estão em Brasília, normalmente nas terças, quartas e quintas, os parlamentares ficam nos apartamentos funcionais ou em hotéis e flats, tudo também custeado pelo Congresso.

O pagamento do auxílio para mudanças inexistentes ocorre, neste ano, em meio a um cenário de ampliação de salários e verbas dos parlamentares.

O Congresso aprovou a elevação escalonada do salário, de R$ 33,7 mil para R$ 39,3 mil agora, passando a R$ 41,7 mil em abril e chegando ao teto do funcionalismo em 2025, R$ 46,4 mil. O último aumento no contracheque dos congressistas havia sido feito em 2014. Desde então, a inflação somou 59%.

Além dos salários, houve reajuste em todas as outras verbas relacionadas ao mandato dos congressistas, o que elevou, por exemplo, o teto do auxílio-moradia dos deputados para R$ 8,4 mil.

Levando em conta só a situação dos deputados federais, o custo mensal é de ao menos R$ 213 mil, somados salário e as verbas relacionadas ao mandato.

Além do contracheque de R$ 39,3 mil, ele recebe R$ 118 mil para contratação de até 25 assessores em Brasília e nos estados, cotão de R$ 45 mil (em média, variando a depender do estado) para reembolso de gastos com passagens aéreas, combustível, hospedagem e alimentação, entre outros, até R$ 8.401 de auxílio-moradia, além da ajuda de custo.

O Senado oferece praticamente todos esses benefícios, mas há algumas diferenças. Os senadores têm carro oficial e contam com funcionários concursados em seus gabinetes, por exemplo.

MAIORIA DOS CONGRESSISTAS NÃO SE MANIFESTA; 7 DIZEM QUE VÃO DOAR OU DEVOLVER VERBA

A reportagem enviou perguntas por email ao gabinete dos cinco senadores e de todos os cerca de 280 deputados federais reeleitos e pediu, entre outros pontos, comprovante de gastos ou de orçamentos relacionados à mudança do estado para Brasília, ou vice-versa. Procurou também as assessorias das duas Casas.

A Câmara disse que só após o pagamento da próxima terça terá um balanço sobre eventuais devoluções. O Senado afirmou que todos os senadores em fim e início de mandato receberam a verba, a exceção de Reguffe (DF), que renunciou ao benefício.

Apenas 7 dos mais de 280 deputados federais procurados se manifestaram -Daniel Trzeciak (PSDB-RS), Reginaldo Veras (PV-DF), Sanderson (PL-RS), Luiza Erundina (PSOL-SP), Celso Russomanno (Republicanos-SP), Gilson Marques (Novo-SC) e Adriana Ventura (Novo-SP).

Eles afirmaram que recusaram ou devolveram a verba para a Câmara ou que vão doar o dinheiro para instituições de caridade.

Lula informa ao TSE ter criado redes sociais direcionadas a evangélicos

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) recebeu na tarde deste sábado (20) petição da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que pede ao tribunal a inclusão “de novos endereços de redes sociais pertencentes ao candidato”, todos direcionadas especificamente ao público evangélico.

Até esse sábado, a maioria dos perfis não tinha nenhum seguidor ou não estava acessível, indicando terem sido recém-criados.

O Datafolha mostrou na quinta-feira (18) que Jair Bolsonaro (PL) ampliou para 17 pontos percentuais a distância sobre Lula neste segmento, saltando de 43% para 49% das intenções de voto no último mês, contra 32% do petista.

A petição, subscrita por dez advogados da campanha de Lula, lista 12 endereços das redes sociais TikTok, Kwai, Twitter, Facebook e Instagram.

Os perfis não trazem, ainda, porém, descrição detalhada. O do Twitter Restitui Brasil, por exemplo, não tinha nenhum seguidor nem descrição.

Uma página na internet também denominada Restitui Brasil traz material de campanha de Lula direcionado a evangélicos.

“O Evangelho de Jesus é o Evangelho da vida em abundância. Não queremos um Brasil armado! O Brasil já foi uma das maiores nações do mundo, é tempo de restituição”, diz um dos textos.

A página tem área para cadastro do internauta, também com questionamento, de preenchimento opcional, de qual igreja ele pertence.

A página aparenta ainda estar em construção. Ela traz também citações bíblicas e material para desmentir ataques de cunho religioso contra Lula: “Pois muitos virão em meu nome, dizendo: ‘Eu sou o Messias!’ e enganarão a muitos”, diz um dos trechos. Em outro: “Será que o Lula é mesmo o verdadeiro inimigo do Povo de Deus?”
Vários dos perfis informados ao TSE são formados pela expressão “evangélicos com Lula”.

A assessoria do candidato do PT afirmou que a criação dos perfis foi um pedido de evangélicos alinhados a Lula.

“Alguns setores evangélicos, tanto dos partidos da coligação quanto de fora dele, nos contataram com interesse em atuar junto a comunidades evangélicas na campanha, e para isso ser possível registramos esses sites e perfis no TSE”, disse a assessoria.

No primeiro dia oficial de campanha, terça-feira (16), tanto Lula como Bolsonaro acenaram ao eleitorado evangélico e trocaram ataques de teor religioso.

Jair Bolsonaro (PL) sugeriu que, se perder as eleições, as pessoas podem ficar proibidas de falar em Deus. Lula acusou seu adversário de estar “possuído pelo demônio”.

Apesar da desvantagem eleitoral no segmento, de ser alvo de variados ataques de cunho religioso nas redes sociais e da petição protocolada no TSE por sua campanha, Lula disse nesta sexta-feira (19) que não fará sua campanha pautada por questões religiosas.

“Questão religiosa não entrará na minha pauta política”, disse o petista, após seguidos acenos ao segmento evangélico e um dia após ter dito que a Bíblia tem que ser cumprida.

“Não é a primeira campanha que eu disputo. Nunca utilizei religião na minha campanha. Quando o ser humano vai à igreja ele vai tratar da sua fé e sua espiritualidade, não vai para discutir política. Não participarei disso.”

Nos bastidores da campanha, porém –e o pedido ao TSE é uma evidência concreta disso–, há uma preocupação com a ascendência de Bolsonaro sobre o público evangélico. O atual presidente conta com o apoio de importantes líderes dessas igrejas.

Uma das esperanças do PT de recuperação de terreno, nesse grupo, está no ex-presidenciável André Janones (Avante), que tem forte penetração nas redes sociais, incluindo nichos de fora da esquerda tradicional, além de outros aliados.

O pastor Paulo Marcelo Schallenberger, convocado pelo PT para dialogar com o setor evangélico, afirmou, por exemplo, que se reuniu com Geraldo Alckmin, vice de Lula, a pedido da campanha. Ele disse ter sugerido um contra-ataque.

Primeiro, que Lula organize uma conversa nas redes sociais para “desmontar as teses” propagadas contra ele e para que o petista mostre como foi o tratamento dele ao setor evangélico durante os seus governos.

“Há uma narrativa que está sendo espalhada dentro das igrejas de demonizar a figura do ex-presidente Lula. Considero isso o novo kit gay. É preciso que a campanha faça um contra-ataque e um aceno mais direto aos evangélicos”, diz o pastor.

Lula se reúne com Pacheco, que promete defender resultado da eleição

Em almoço com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), prometeu que o Congresso Nacional atuará para garantir o respeito e o resultado do processo eleitoral.

Segundo presentes no almoço desta quarta-feira (13), Pacheco afirmou que, na condição de presidente do Congresso, vai reagir diante de qualquer tentativa de ruptura democrática e que vai garantir a posse do ganhador das eleições de outubro.

“Nós todos saímos daqui com a garantia de que o presidente do Congresso Nacional, que, como nós temos dito, é a última ratio [último recurso] de defesa da democracia, dará posse aos eleitos no dia 1° de janeiro”, afirmou o líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

Pacheco, ainda segundo os presentes, se justificou sobre a declaração da última segunda-feira (11) em que cobrou tanto o petista quanto Jair Bolsonaro (PL) pela escalada de violência política no Brasil, em especial sobre o caso do bolsonarista que assassinou um petista em Foz do Iguaçu (PR).

O presidente do Senado afirmou aos participantes que ele quis destacar na ocasião que os dois são os líderes de maior expressão atualmente, concentrando a maior parte das intenções de voto nas pesquisas -e, portanto, têm um peso importante no controle de seus respectivos eleitorados.

Mas retificou que, na sua opinião, o discurso dos dois não é comparável e que o atual presidente é o principal responsável por espalhar discursos contra seus adversários.

“O presidente do Senado deixou muito claro que, quando mencionou isso, mencionou pelo quilate, pela importância, pelo peso eleitoral que cada um dos concorrentes tem. Não quis dizer, absolutamente, que estavam em graus equivalentes de fomento de apoio ou incitação qualquer à violência”, disse o senador Jean Paul Prates (PT-RN), líder da minoria.

Pacheco havia se pronunciado dois dias após o caso. Ele qualificou as cenas de “repugnantes, chocantes, expressão pura, infelizmente, do momento político de muito ódio, de muita intolerância”. “As pessoas estão se matando, matando umas as outras por motivo ideológico, motivo político”, disse na ocasião.

Então, ele também falou sobre a responsabilidade dos líderes políticos.

“Especialmente daqueles que disputam a eleição e que têm debaixo de si uma grande militância política, uma aceitação e adeptos no Brasil todo. E me refiro ao presidente Bolsonaro e ao presidente Lula”, disse.

Questões de alianças políticas e apoio na corrida eleitoral, de acordo com os presentes, não foram discutidas durante o encontro.

“Essas coisas de estratégia, de tática eleitoral e de aliança não foram discutidas” afirmou o líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PA).

Estiveram no almoço, além do ex-presidente e do presidente do Senado, senadores da oposição a Bolsonaro; o candidato a vice, Geraldo Alckmin (PSB); a presidente do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann; e o coordenador político da campanha, Aloizio Mercadante.

Foi a primeira vez que Lula e Pacheco se encontraram pessoalmente.

Segundo interlocutores, petistas já vinham tentando organizar o encontro entre Lula e Pacheco em meio às negociações em Minas Gerais, onde PT e PSD fecharam acordo para lançar o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), ao governo do estado.

Pacheco vinha dizendo que a reunião era institucional -e que, por isso, deveria acontecer na residência oficial do Senado-, mas, apesar disso, o almoço não estava em sua agenda oficial. Em abril, Pacheco também recebeu o candidato do PDT à Presidência, Ciro Gomes (PDT).

O encontro entre o senador mineiro e o ex-presidente acontece nesse momento, entre outras coisas, justamente pelo acordo político sobre Minas Gerais ter sido acertado.

A importância do encontro também foi tema de uma conversa entre Lula e o senador Alexandre Silveira (PSD-MG) na manhã anterior, terça-feira (12). Ele é um dos principais interlocutores de Pacheco no Congresso.

No entendimento de Silveira, o presidente do Senado é um importante aliado na defesa da legitimidade das eleições, constante alvo de ataques de Bolsonaro, e contra a escalada de violência.

Petistas também entendem que Pacheco tem se comportado com uma voz neutra dentro do Congresso e, por isso, é um importante ponto de apoio em meio a um clima eleitoral cada vez mais polarizado pela base do governo.

Pela manhã, Lula se encontrou com deputados federais e senadores aliados no Congresso. Segundo presentes no encontro, ele reproduziu o tom do discurso da noite anterior feito a militantes e pediu que também os políticos evitem cair em provocações de adversários.

Candidato a vice-presidente, Geraldo Alckmin citou os recentes casos de violência política contra petistas -o assassinato do tesoureiro do partido em Foz do Iguaçu, a bomba caseira atirada no Rio de Janeiro e o ataque a drone em Uberlândia (MG)- para incentivar que os aliados enfatizem discursos pacificadores durante a campanha.

Apesar disso, Lula também incentivou que os políticos não deixem de ir às ruas durante a corrida eleitoral e falou da importância de ter uma bancada forte no Congresso para retomar o controle do Orçamento.

O petista vem criticando duramente o que chama de orçamento secreto e de uso eleitoral do dinheiro público por Bolsonaro e aliados do centrão.

Congresso é aprovado por 10% e tem pior índice em 3 anos, diz Datafolha

A aprovação ao trabalho de deputados e senadores chegou ao mais baixo patamar na atual legislatura, iniciada em 2019, mostra pesquisa do Datafolha realizada dos dias 13 a 16 de dezembro.

Apenas 10% dos entrevistados disseram considerar bom ou ótimo o trabalho do Congresso. O índice é três pontos percentuais menor do que a última pesquisa, de setembro, e menos da metade do observado há quase três anos (22%), quando teve início o mandato dos atuais deputados e da maioria dos senadores.

É bem menor também do que agosto de 2020 (17%), data da última pesquisa que coincidiu com as gestões de Rodrigo Maia (sem partido-RJ) na Câmara e de Davi Alcolumbre (DEM-AP) no Senado.

Desde fevereiro, a Câmara está sob o comando de Arthur Lira (PP-AL) e o Senado, de Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O Datafolha mostra ainda que o número de brasileiros que avalia como ruim ou péssimo o trabalho do Congresso teve uma oscilação para baixo, passando de 44% na última pesquisa, em setembro, para 41%.

Os que consideram regular a atuação dos parlamentares foram de 40% para 45%. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. O instituto entrevistou presencialmente 3.666 pessoas de 16 anos ou mais, de todas as classes e em todas as regiões, em um total de 191 municípios.

Assim como na pesquisa anterior, entre quem considera o governo de Jair Bolsonaro (PL) bom ou ótimo há uma visão um pouco menos negativa do Congresso –18% também aprovam a atuação dos parlamentares.

Esse contingente, porém, vem encolhendo. Em setembro, era 23%. Lira é aliado do presidente da República, e seu partido, o PP, deve integrar a chapa da candidatura de Bolsonaro à reeleição.

Cabe a ele a decisão, de maneira individual, sobre o andamento de pedidos de impeachment. Já Pacheco, também pré-candidato ao Palácio do Planalto, adota uma posição de independência.

Do lado da reprovação da atuação dos parlamentares, os índices são maiores do que a média entre os mais instruídos (46%), os mais ricos (53%) e os que consideram ruim ou péssimo o governo Bolsonaro (46%).

De setembro para cá, o Congresso passou por episódios como a discussão e aprovação da PEC dos Precatórios, que abriu margem no orçamento para pagamento do Auxílio Brasil de R$ 400, e as movimentações de bastidor motivadas pela decisão do Supremo Tribunal Federal de bloquear, por falta de transparência, a execução do Orçamento federal manejado pela cúpula do parlamento.

A decisão da corte foi revista, posteriormente, mediante a promessa de divulgação futura do nome dos parlamentares beneficiados. A Câmara também tentou, sem sucesso, aprovar a PEC (proposta de emenda à Constituição) que ampliava a influência do Congresso no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).

A medida, capitaneada por Lira, era apontada por críticos como uma espécie de vingança do mundo político contra a Operação Lava Jato.

No Senado, houve uma protelação de meses para a apertada aprovação do nome de André Mendonça para o Supremo Tribunal Federal. Indicado por Bolsonaro, ele foi apoiado por diversas lideranças evangélicas.

A atual legislatura foi eleita em meio à onda antipolítica de 2018. Na ocasião, os eleitores patrocinaram a maior renovação na Câmara desde pelo menos 1998, reduzindo o rol de reeleitos a menos da metade das 513 cadeiras.

O nanico PSL pelo qual Bolsonaro foi eleito (hoje o presidente está no PL), por exemplo, elegeu 52 deputados e se tornou a segunda maior bancada da Casa, ligeiramente atrás do PT. O resultado das urnas mexeu também com o perfil da Câmara, elevando a representação de militares e líderes evangélicos, enquanto a de professores e médicos registrou queda.

O clima geral era de mudança. No final de 2018, 56% dos entrevistados diziam acreditar que os novos congressistas teriam um desempenho ótimo ou bom, número superior ao verificado antes das duas legislaturas anteriores (49% e 40%).

Análise feita pela Folha de S.Paulo da trajetória e desempenho dos 120 deputados federais que jamais haviam exercido mandato público na vida mostrou, porém, que salvo exceções, tudo transcorreu de acordo com o que muitos deles chamavam de a “velha política”.

Do grupo de novatos eleitos, apenas 11 conseguiram, em algum momento, ocupar alguma das 52 cadeiras de comando nas mesas diretoras da Câmara e do Senado e nas comissões permanentes das Casas.

Não houve alterações substantivas também no uso das generosas verbas públicas do Parlamento e os escândalos também não passaram ao largo do pelotão da “nova política”.

Com 678,5 mil votos, a senadora Juíza Selma (MT) se elegeu pelo PSL adotando um forte discurso de combate à corrupção. Já no Podemos, foi condenada pela Justiça Eleitoral por abuso de poder econômico e compra de voto e perdeu o mandato. Houve uma eleição suplementar no ano passado para decidir um novo ocupante da vaga.

A pastora e cantora gospel Flordelis (PSD-RJ) chegou à Câmara com a maior votação do Rio para uma candidata a deputada federal. Tinha como principal cartão de visitas o trabalho missionário em favelas, tendo adotado 55 filhos. Acabou cassada e presa sob acusação de ter mandado matar o marido.

Já Daniel Silveira (PSL-RJ) elegeu-se na onda bolsonarista. Após uma série de declarações ofensivas contra ministros do Supremo, foi preso em fevereiro por ordem de Alexandre de Moraes, medida que foi corroborada pelo plenário da Câmara.

Em toda a série histórica do Datafolha, somente uma vez a avaliação positiva do Congresso esteve numericamente acima da negativa. Foi em dezembro de 2003, primeiro ano da primeira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) -24% a 22%, ou seja, em empate técnico dentro da margem de erro.

Os picos negativos ocorreram em 1993 e 2017. Na primeira ocasião, 56% de reprovação e 7% de aprovação, o país passava por hiperinflação e também assistia à revelação do desvio de recursos federais para o bolso de políticos, escândalo que ficou conhecido como o dos anões do Orçamento.

Na segunda, 60% de reprovação e apenas 5% de aprovação, recorde negativo de toda a série histórica, a Câmara havia pouco tempo antes barrado, pela segunda vez, o afastamento do então presidente Michel Temer (MDB) em decorrência de denúncias de corrupção apresentadas pela Procuradoria-Geral da República.

Apesar dos números negativos da atual legislatura, o desempenho ainda continua menos ruim do que a da anterior se comparado ao mesmo período (quase três anos de mandato), que coincide justamente com o recorde negativo de 2017.

Em relação à legislatura que foi eleita em 2010, há similaridade, na comparação com igual período de mandato -42% de rejeição e 13% de aprovação. Já a eleita em 2006 apresentava um desempenho ligeiramente superior um ano antes do seu término -15% de aprovação e 40% de rejeição.

Projeto de Lira para emendas mantém poder sobre fatia bilionária do Orçamento

Um dia depois de o Supremo Tribunal Federal mandar suspender a execução das polêmicas emendas do relator-geral do Orçamento, o texto de um projeto de resolução elaborado pela Mesa da Câmara com o objetivo de manter o controle sobre as bilionárias verbas começou a circular entre os deputados.

A ideia é que a proposta, capitaneada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e a que a reportagem teve acesso, seja aprovada nas próximas semanas em sessão do Congresso Nacional e sirva como objeto de negociação para que o STF libere a execução das emendas.

Por 8 votos a 2, a corte decidiu na quarta-feira (10) suspender “integral e imediatamente” o pagamento das verbas a deputados e senadores, além de determinar que o Congresso dê “ampla publicidade, em plataforma centralizada de acesso públicos”, a todos os documentos relacionados à distribuição dessas verbas em 2020 e 2021.

Os repasses deverão ser suspensos até que o STF julgue o mérito da ação do PSOL, ainda sem data definida. A decisão atingiu em cheio o mundo político, abalando um esquema de negociação de verbas públicas que tomou corpo em 2020 e 2021.

Todos os anos deputados e senadores têm o direito de direcionar verbas do Orçamento federal para obras e investimentos em seus redutos eleitorais. Para isso, contam com as chamadas emendas parlamentares individuais (definidas por cada um dos 594 congressistas) e coletivas (de bancadas estaduais, por exemplo).

Elas são divididas de forma equânime entre os parlamentares e a execução pelo governo é obrigatória.

A partir do Orçamento de 2020, porém, a cúpula do Congresso começou a colocar em prática uma manobra com o objetivo de manter o seu poder de moeda de troca –se aproveitando da fragilidade política do governo Bolsonaro, que foi obrigado a abrir mão de parte da execução dessa verba.

Essa manobra se materializou por meio do relator-geral do Orçamento: um deputado ou senador que na maior parte dos casos apenas empresta o nome para a divisão da verba, que é decidida, na prática, pela cúpula da Câmara e do Senado.

As emendas de relator deste ano (na rubrica RP9) estão na ordem de R$ 16,8 bilhões e podem ser distribuídas sem qualquer critério, a depender da conveniência política do governo e dos parlamentares que comandam a Câmara e o Senado.

Na prática, essa decisão tem se concentrado, na Câmara, nas mãos de Arthur Lira, aliado de Jair Bolsonaro, que usa os recursos para garantir fidelidade ao seu redor e a projetos do Palácio do Planalto. Isso ocorreu, por exemplo, na aprovação da PEC dos Precatórios, nesta semana.

A transparência na decisão de divisão e na execução dessas emendas é baixíssima e sem padrão. Em alguns casos, é possível saber detalhes por meio de complicadas ferramentas de transparência de ministérios.

O texto que começou a circular entre deputados nesta quinta trata apenas de mudanças na questão da transparência, além de alterar as regras só daqui em diante. Ele não trata das emendas de relator de 2020 e 2021.

E não muda em nenhum ponto o atual poder do governo e da cúpula do Congresso de privilegiar determinados deputados em detrimento de outros, nem de patrocinar repasses em períodos de votação de grande interesse do governo.

“Esse texto trata do ponto da decisão do Supremo que fala sobre a necessidade de transparência, mas não resolve outro ponto da decisão da ministra Rosa Weber , que é o de impedir que o governo favoreça um parlamentar e prejudique outro na distribuição de emendas”, afirmou o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), vice-presidente da Comissão Mista de Orçamento.

O texto do projeto de resolução mantém o poder do relator-geral do Orçamento de apresentar emendas, deixando claro que ele pode receber “solicitações”, sem especificar de quem, desde que elas sejam publicadas no site da Comissão Mista de Orçamento do Congresso e encaminhadas ao Poder Executivo.

“As indicações somente poderão ser feitas quando compatíveis com o plano plurianual e com a Lei de Diretrizes Orçamentárias, e estiverem de acordo com a política pública a ser atendida”, diz a minuta do projeto de resolução (que visa alterar a resolução do Congresso 1/2006, que trata da Comissão Mista de Orçamento).

“Na fase de execução da lei orçamentária, o projeto que ora apresentamos amplia a transparência do processo de execução dessas emendas, definindo regras claras e objetivas para publicação das indicações a serem realizadas pelo relator-geral, bem como das solicitações de recursos que as tiverem fundamentado” diz a justificativa da proposta.

Lira, que está em viagem a Portugal, confirmou nesta quinta que a Câmara irá apresentar projeto para dar mais transparência às emendas.

Ele defendeu o modelo, afirmando que “em vez de se criticar o que tecnicamente não se conhece, é importante que se dê oportunidade ao Parlamento, que sempre foi aberto, que modifica a vida das pessoas com essas emendas, a chance de explicar e de deixar este debate mais claro, sem politizá-lo como tudo que vem acontecendo”.

Aliado de Jair Bolsonaro, o presidente da Câmara disse que seria um retrocesso deixar o comando das emendas só com o governo.

“Se houver uma reversão, para o RP2, por exemplo, que volta para o comando do Executivo, aí sim que nem a imprensa, nem os deputados, nem a população saberão da discricionariedade do Poder Executivo. Ele vai dar a quem ele quiser atender, com quanto ele quiser atender, quando quiser atender”, disse.

A posição do presidente da Câmara em relação ao novo projeto das emendas deve sofrer contestação dentro do Congresso.

Vice-presidente da Câmara, o deputado Marcelo Ramos (PL-AM) defende uma proposta diferente. “Acho que o certo mesmo era pegar essas emendas RP9 e distribuir de forma igualitária, assim como as emendas impositivas .”

A senadora Rose de Freitas (MDB-ES), presidente da Comissão de Orçamento, também critica o modelo de manejo orçamentário por meio das emendas de relator.

“Na comissão, não vejo espaço para aceitar essas emendas de relator, considero extinto o RP9”, diz a senadora, que defende a extinção das emendas de relator com o objetivo de distribuir verbas do orçamento entre deputados.

Segundo ela, o Senado irá apresentar sua proposta e, em conjunto com a Câmara, irá definir qual melhor projeto será levado à votação pelo Congresso Nacional. Por ser tema orçamentário, qualquer modificação tem que ter o aval de deputados e senadores, em conjunto.

Nos bastidores, havia a pressão de deputados para que fosse dado um drible na decisão do Supremo. Uma das ideias era apenas mudar a rubrica da emenda de relator (de RP9 para RP2, que são as emendas de comissão e de bancada) e continuar o mesmo modelo.

Há uma avaliação, porém, de que isso liberaria os cerca de R$ 8 bilhões ainda a empenhar (jargão que representa a reserva do Orçamento para o gasto) em 2021, mas deixaria os R$ 9 bilhões já empenhados neste ano em suspenso. Além de representar uma afronta ao STF, com quem se busca ainda um acordo político.

*Colaborou Giuliana Miranda, em Lisboa.

ENTENDA O QUE SÃO E COMO FUNCIONAM AS EMENDAS PARLAMENTARES

A cada ano, o governo tem que enviar ao Congresso até o final de agosto um projeto de lei com a proposta do Orçamento Federal para o ano seguinte. Ao receber o projeto, congressistas têm o direito de direcionar parte da verba para obras e investimentos de seu interesse. Isso se dá por meio das emendas parlamentares.

  • As emendas parlamentares se dividem em:

    Emendas individuais: apresentadas por cada um dos 594 congressistas. Cada um deles pode apresentar até 25 emendas no valor de R$ 16,3 milhões por parlamentar (valor referente ao Orçamento de 2021). Pelo menos metade desse dinheiro tem que ir para a Saúde;

  • Emendas coletivas: subdivididas em emendas de bancadas estaduais e emendas de comissões permanentes (da Câmara, do Senado e mistas, do Congresso), sem teto de valor definido

    Emendas do relator-geral do Orçamento: As emendas sob seu comando, de código RP9, são divididas politicamente entre parlamentares alinhados ao comando do Congresso e ao governo;

CRONOLOGIA

Antes de 2015

A execução das emendas era uma decisão política do governo, que poderia ignorar a destinação apresentada pelos parlamentares

2015

Por meio da emenda constitucional 86, estabeleceu-se a execução obrigatória das emendas individuais, o chamado orçamento impositivo, com algumas regras:

a) execução obrigatória até o limite de 1,2% da receita corrente líquida realizada no exercício anterior;

b) metade do valor das emendas destinado obrigatoriamente para a Saúde

c) contingenciamento das emendas na mesma proporção do contingenciamento geral do Orçamento. As emendas coletivas continuaram com execução não obrigatória

2019

O Congresso amplia o orçamento impositivo ao aprovar a emenda constitucional 100, que torna obrigatória também, além das individuais, as emendas de bancadas estaduais (um dos modelos das emendas coletivas)

Metade desse valor tem que ser destinado a obras

O Congresso emplaca ainda um valor expressivo para as emendas feitas pelo relator-geral do Orçamento: R$ 30 bilhões

Jair Bolsonaro veta a medida e o Congresso só não derruba o veto mediante acordo que manteve R$ 20 bilhões nas mãos do relator-geral

2021

Valores totais reservados para cada tipo de emenda parlamentar:

Emendas individuais (obrigatórias): R$ 9,7 bilhões

Emendas de bancadas (obrigatórias): R$ 7,3 bilhões

Emendas de comissão permanente: R$ 0

​Emendas do relator-geral do Orçamento (código RP9): R$ 16,8 bilhões

Traições e ausência de deputados aliados minguaram apoio à PEC dos precatórios

A votação preliminar que testou o apoio do plenário da Câmara à PEC (proposta de emenda à Constituição) dos precatórios mostrou a dificuldade do governo em conseguir apoio para aprovar a medida que amplia gastos em ano eleitoral e viabiliza o Auxílio Brasil.

A análise do mapa de votações de um requerimento na quarta-feira (27) para que o texto fosse retirado de pauta –e que foi usado como teste de apoio ou rejeição ao mérito da medida– revelou traições e ausências de deputados de siglas da base do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O PL, da ministra Flávia Arruda (Secretaria de Governo) e comandado por Valdemar Costa Neto, que tenta filiar Bolsonaro à legenda, foi um desses exemplos.

Ministro João Roma (Cidadania), primeiro à esquerda, conversa com o líder da bancada do MDB, Isnaldo Bulhões (AL), terceiro à esquerda, durante análise da Foram 16 ausentes, 2 traições e 25 votos em linha com o governo. Como as ausências contaram, na prática, como posição contrária à PEC, a bancada do PL praticamente rachou.

O partido lidera, ao lado do PP, o centrão, bloco de sustentação política de Bolsonaro.

Com a sinalização ruim, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), chegou a se reunir com Flávia e os ministros Ciro Nogueira (Casa Civil) e João Roma (Cidadania) na noite de quarta para tentar viabilizar a votação da PEC ainda nesta quinta –mas isso fracassou.

A insegurança sobre a aprovação empurrou a análise da proposta para a próxima semana.

Para que uma PEC seja aprovada, é necessário o voto de ao menos 308 dos 513 deputados. No requerimento-teste, o apoio à medida chegou apenas a 256, ou seja, 52 votos a menos do mínimo necessário.

Interlocutores de Bolsonaro culpam a decisão de Lira, que quis retomar nesta semana as votações na Câmara pelo sistema presencial. O governo calcula que cerca de 50 deputados da base não estavam em Brasília na quarta.

PP, PL, Republicanos e PSC formam o bloco de partidos mais ligados ao governo –três deles têm ministério. Mas o número de ausentes nesse grupo chegou a 32 deputados.

Para alcançar os 308 votos necessários para aprovar a PEC, o governo terá de mobilizar bancadas que tendem a ser menos fiéis que o núcleo duro da base governista.

De acordo com integrantes do PL, vários pontos pesaram na postura do partido, entre eles pressão de professores, que perderam recursos com a medida, e pressão para maior agilidade do governo na liberação de recursos para as emendas apresentadas pelos parlamentares ao Orçamento.

“Há uma insatisfação com a forma como o governo vem tratando os deputados do partido”, afirmou o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM).

Ele disse ter apresentado uma proposta de mudança ao governo para que os professores sejam contemplados.

O PTB de Roberto Jefferson, até pouco tempo um ferrenho apoiador de Bolsonaro, teve maioria contrária ao dispositivo que acelerava a votação da PEC.

Outro partido importante que se colocou contra a PEC foi o MDB –20 deputados ficaram contra e 5 se ausentaram. Só 8 manifestaram intenção de apoiar a medida.

O líder da bancada, Isnaldo Bulhões (AL), também afirmou que um conjunto de fatores pesou na decisão da legenda. Ele foi procurado durante toda a quarta por governistas e ministros na tentativa de que o partido mudasse de opinião, mas não houve sucesso.

O PSDB, que atua em linha independente, também rachou. Foram 19 a favor da medida e 12 contra (incluindo ausentes).

O Cidadania, outro integrante do bloco independente, só deu um voto a favor da PEC. O Novo, sigla com 8 cadeiras na Câmara, votou integralmente contra a proposta.

A falta de apoio desse grupo (MDB, PSDB, Cidadania e Novo) é outro entrave para o avanço do texto na Casa.

Integrantes da oposição e de legendas do centro querem aprovar apenas a parte que assegura o Auxílio Brasil de R$ 400 a partir de dezembro. Dizem que abrir margem para outros gastos, como a engorda de emendas parlamentares em 2022, só ajudará eleitoralmente a base governista.

De acordo com aliados do governo, o único objetivo dos opositores da PEC é antecipar o debate eleitoral do próximo ano.

“No fundo, o que não se quer –a oposição especialmente– é que o presidente Bolsonaro pague o Auxílio Brasil, que ele possa socorrer essas pessoas que estão necessitadas neste momento. Então, é uma questão política”, disse o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR).

Na quarta, Roma chegou a sugerir a aliados que Lira recuasse na decisão sobre as votações presenciais. Até a semana passada, a Câmara tinha permitido que deputados votassem por um sistema remoto por causa da pandemia da Covid-19.

Um dos pontos de divergência em relação à PEC trata da garantia do pagamento de dívidas de repasses do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério).

Há cerca de R$ 15,6 bilhões em precatórios desse tema para Bahia, Pernambuco, Ceará e Amazonas.

A oposição usa isso como discurso de que professores perderão recursos se a PEC dos precatórios for aprovada.

Diante da resistência, inclusive em partidos de centro e da base do governo, o relator da proposta, deputado Hugo Motta (PB), que é líder do Republicanos, passou a avaliar retirar essa verba do teto de gastos –regra que impede o crescimento das despesas acima da inflação.

A tese é que o dinheiro para o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) não é considerado no cálculo do limite de gastos federais.

Ciro Nogueira acumula derrotas em quase 3 meses na Casa Civil de Bolsonaro

Após dois meses e meio da posse de Ciro Nogueira (PP) na Casa Civil de Jair Bolsonaro, o governo continua sofrendo derrotas em série no Senado, casa de origem do ministro.

Além de consolidar a influência do centrão sobre o governo e reforçar a ala política em um momento de tensão institucional, a escolha de Ciro para o lugar do general Luiz Eduardo Ramos trazia também a expectativa do Palácio do Planalto de amenizar a sua crítica situação no Senado.

Entre outras tarefas, o senador tinha como uma das principais missões assumir o papel de estrategista do governo na CPI da Covid, importante foco de desgaste do presidente da República no Senado. Até então, o principal articulador do Planalto na comissão era o ministro Onyx Lorenzoni (Trabalho e Previdência).

Além de Ciro não conseguir alterar o rumo da CPI, que na quarta-feira (20) apresentou seu relatório final com a proposta de punição de Bolsonaro por nove crimes, entre eles prevaricação e charlatanismo, o Senado foi palco nesses dois meses e meio de vários outros reveses para o Planalto.

A reforma do Imposto de Renda, uma das prioridades da equipe de Paulo Guedes (Economia), foi aprovada na Câmara em 1º de setembro, mas, desde então, empacou no Senado.

O governo esperava usar o projeto para conseguir viabilizar recursos para a reformulação do Bolsa Família, mas, diante da resistência no Senado, teve que procurar outros caminhos.

Nesse mesmo dia em que a Câmara -comandada por Arthur Lira (PP-AL), alinhado a Bolsonaro- aprovava a reforma do IR, a equipe de Guedes sofreu uma outra derrota significativa no Senado, a rejeição de sua proposta de minirreforma trabalhista por uma votação expressiva, 47 votos a 27.

Em outro sinal claro da desarticulação do governo no Congresso, 12 vetos presidenciais foram derrubados por Câmara e Senado no final de setembro, entre eles um em que havia acordo entre os líderes partidários para ser mantido -o que permite que partidos políticos se organizem em uma federação pelo tempo mínimo de quatro anos.

“A votação dos vetos foi uma coisa curiosa, a impressão era que não tinha governo, não existia articulação, a coisa se deu sem reação nenhuma, nunca vi uma bancada do governo tão desarticulada”, afirmou o senador Alvaro Dias (Podemos-PR).

“Uma vez uma pessoa me perguntou: ‘Por que aquele secretário do seu governo era tão bom e agora é tão ruim?’. E eu respondi: ‘Porque naquela época tinha governador’. Não adianta ser bom na política, conhecer os parlamentares e coisa e tal, se o presidente não ajuda.”

Para que um veto presidencial seja derrubado, é preciso o voto de mais da metade dos 513 deputados federais e 81 senadores. Antes de Bolsonaro, eram raras situações como essa.

Além das federações dos partidos, foram retomados projetos como o que prevê repasses do governo para ampliar o acesso das escolas públicas à internet em alta velocidade e a suspensão da prova de vida do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).

“Eu continuo achando o governo em um processo de desarticulação”, diz o senador Eduardo Girão (Podemos-CE), membro da CPI da Covid.

“As votações estão ocorrendo de uma forma muito liberada. É importante para a liberdade legislativa, do parlamentar, mas é perigoso do ponto de vista da governabilidade”, afirma o senador, que tem adotado posições pró-governo na comissão.

Apesar das derrotas em série, há senadores que avaliam que ao menos houve melhora na interlocução entre o Legislativo e o governo, o que ajudou a tranquilizar o clima político.

“Acho que o diálogo com o Congresso foi meio suavizado. No sentido de estabelecer o clima de diálogo, no sentido de: sou crítico, sou oposição, mas sei com quem conversar. Não que o país ficou mais democrático, mas foram azeitados os dutos de comunicação da oposição com o governo”, afirmou Esperidião Amim (PP-SC).

Integrante da bancada governista na CPI, o senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) diz também ver melhora na articulação política do Planalto, embora não tenha citado nenhum exemplo específico na conversa com a Folha. “Melhorou. Está fazendo um bom trabalho. A interlocução era fraca, ficou mais fortalecida.”

Senador de oposição, Paulo Rocha (PT-PA) discorda: “Só melhorou para eles só atende à sobrevida política do Bolsonaro”, afirma.

Um dos principais entraves que o governo enfrenta no Senado tem sido a demora na análise da indicação de André Mendonça para o Supremo Tribunal Federal.

Bolsonaro formalizou a escolha do advogado-geral da União em 13 de julho. Até hoje, porém, o presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), Davi Alcolumbre (DEM-AP), não marcou data para sua sabatina.

Apesar de a articulação política de Bolsonaro ser a principal função de Ciro Nogueira, nesse caso o ministro integra um grupo, o centrão, que tem resistência a Mendonça.

Esse grupo avalia que o escolhido por Bolsonaro não se encaixa no perfil desejado, que é o de total oposição aos métodos adotados pela Lava Jato, operação que abalou o mundo político e que, hoje, está em contínuo processo de desgaste.

O preferido do centrão para a vaga no STF é o procurador-geral da República, Augusto Aras.

Nos bastidores, parlamentares também reclamam que há problemas de execução de emendas do Orçamento destinada aos senadores, o que tem dificultado mais ainda a situação do Palácio do

Planalto na Casa. A Casa Civil não se manifestou sobre as perguntas enviadas pela Folha.

Problemas do governo no Senado após a nomeação de Ciro Nogueira

  • – André Mendonça: Bolsonaro indicou o advogado-geral da União em 13 de julho. Até hoje o presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), Davi Alcolumbre (DEM-AP), não marcou data para sua sabatina
  • – ​Impeachment de Alexandre de Moraes: O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), rejeitou em 25 de agosto o pedido de impeachment formalizado por Bolsonaro contra o ministro do Supremo Tribunal Federal
  • – Minirreforma trabalhista: O plenário do Senado derrubou em 1º de setembro, de forma acachapante (47 votos a 27), a medida provisória que criava três novos modelos de contratações, com menos direitos trabalhistas
  • – Devolução de MP: O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), devolveu ao governo, em 14 de setembro, a medida provisória editada por Bolsonaro que limita a remoção de conteúdo publicado nas redes sociais
  • – Vetos derrubados: o governo havia negociado com os parlamentares a manutenção do veto de Bolsonaro ao projeto que permite siglas se unirem em federação, mas o Congresso derrubou a decisão do presidente em 27 de setembro. Foram 45 votos no Senado (eram necessários 41). Nesse mesmo dia, o Senado e a Câmara derrubaram outros 11 vetos de Bolsonaro
  • – Reforma do Imposto de Renda: Uma das bandeiras de Paulo Guedes (Economia), projeto foi rapidamente aprovado na Câmara, em 1º de setembro, mas foi para a gaveta no Senado
  • – Privatização dos Correios: Câmara aprovou em 5 de agosto projeto que viabiliza a privatização. No Senado, texto está até hoje em tramitação da Comissão de Assuntos Econômicos, sem relatório apresentado ainda
  • – Marco das ferrovias: O Senado aprovou o projeto que permite que a iniciativa privada explore e construa ferrovias por meio de outorga de autorização, priorizando texto próprio e ignorando MP editada pelo governo em agosto
  • – CPI da Covid: Já em funcionamento antes da posse de Ciro Nogueira, que era titular da comissão, colegiado produziu relatório propondo indiciamento de Bolsonaro por 9 tipificações de crimes
  • – Meio ambiente: Câmara aprovou em maio projeto que flexibiliza licenciamento ambiental e, em agosto, o que facilita regularização de terras ocupadas. Os dois projetos ainda estão na fase de tramitação em comissões, no Senado

Risco impeachment de Bolsonaro se assemelha mais ao de Temer do que ao de Collor e Dilma

Apesar do ressurgimento da pressão pelo impeachment de Jair Bolsonaro, o presidente navega em um conjunto de cenários que, hoje, se assemelha mais à situação vivida por Michel Temer (MDB) em 2017 do que às de Fernando Collor (PRN) em 1992 e Dilma Rousseff (PT) em 2016.

Collor e Dilma perderam os mandatos por meio de processos de impeachment. Temer escapou por duas vezes de ser afastado do cargo devido a denúncias criminais apresentadas à Câmara pela Procuradoria-Geral da República.

De seis fatores de propulsão de um impeachment, Dilma e Collor tinham contra si todos eles.

1) Alta reprovação popular;

2), vigorosos protestos de rua que pediam a destituição de ambos;

3) uma perspectiva real de poder, por parte dos adversários, encarnada na figura de um vice que participou da liderança do movimento pela destituição -Temer em 2015 e 2016-  ou se mostrava claramente disposto a receber a faixa presidencial – Itamar Franco, em 1992.

Além desses, 4) havia tempo de governo restante ainda relativamente longo, mais de dois anos, em ambos os casos, 5) base congressual em frangalhos e 6) crise econômica.

Temer tinha claramente contra si apenas um desses fatores, a alta reprovação popular. Não havia vice nesse caso, mas o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), político que assumiria temporariamente o cargo – e promoveria eleições indiretas das quais despontava como favorito-, trabalhou politicamente para manter Temer na cadeira.

Bolsonaro tem, atualmente, um desses pontos negativos em seu encalço: a situação econômica, que mescla estagnação, inflação em disparada e desemprego na casa de 14 milhões de pessoas. Desses, o aumento de preços deve continuar impactando negativamente a popularidade do presidente –a perspectiva de alta para o IPCA (índice oficial) foi reforçada, dentre outros motivos, pela paralisação de caminhoneiros fomentada pelo próprio Bolsonaro.

Outros dois fatores também lhe são desfavoráveis, mas carregam ainda características específicas.

A sua alta reprovação popular, 51% de ruim ou péssimo na última pesquisa do Datafolha, do início de julho, ainda está distante dos cerca de 70% de Collor, Dilma e Temer no início da tramitação de seus casos.

Há contra ele protestos de rua substanciais. Ao mesmo tempo, ele demonstrou ter um apoio não desprezível nos atos de raiz golpista organizados por ele e aliados no dia 7 de setembro.

Os três demais fatores são atualmente favoráveis a Bolsonaro, sendo que um deles se acentuará cada vez mais com o tempo: um processo de impeachment tende a durar meses, e resta pouco mais de 1 ano e 3 meses de gestão. Não há notícia de que o vice, o general da reserva Hamilton Mourão, articule ou esteja claramente aberto a promover uma perspectiva de poder em torno de seu nome.

No Congresso, o centrão continua assegurando apoio político que, se mantido, inviabiliza a obtenção dos 342 votos necessários para a autorização ao Senado da abertura do processo de impeachment –momento em que o presidente é afastado.

O terremoto causado pelas falas golpistas de Bolsonaro nos palanques do 7 de setembro inflou as articulações pró-impeachment no Congresso, mas a carta de recuo capitaneada por Temer amainou os ânimos, pelo menos por ora.

“As manifestações de 7 de Setembro e suas consequências são página virada diante da retratação do presidente. Portanto, para ser coerente, eu não vou olhar para trás. Faço uma convocação para que todos passem a trabalhar pelo Brasil”, disse o presidente do PSD, Gilberto Kassab. Ele foi um dos que, ao lado do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), retomaram a discussão do impeachment após o feriado.

“Que, no ano que vem, ano das eleições, todos, através de seus partidos, apresentem seus projetos para a nação, seja em termos de candidaturas, seja em termos de programa de governo. A hora é de trabalhar”, completou Kassab.

Alguns, porém, lembram que não é preciso ter os 342 votos para iniciar a tramitação do caso, que essa adesão ocorre no meio do caminho.

“Não precisa ter os votos. Vivi o impeachment do Collor. Quando começou, não havia votos suficientes. De uma hora para outra, a coisa virou”, afirma o deputado Renildo Calheiros (PC do B-PE).

A decisão de dar ou não sequencia aos cerca de 130 pedidos de impeachment é do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Aliado de Bolsonaro, ele não tem dado nenhuma indicação de que pretenda tomar essa atitude por enquanto.

“A condição real para impeachment são 342 votos na Câmara e isso não tem. Tem mais hoje do que tinha antes do dia 7. Esses fatores influenciam, mas o que importa mesmo é voto na Câmara”, afirma o vice-presidente da Casa, Marcelo Ramos (PL-AM).

As legendas independentes na Câmara têm 187 deputados. A oposição tem 132, o que dá um total de 319 parlamentares. Soma-se a esse grupo cerca de 20 parlamentares do PSL que ficaram alinhados ao presidente da sigla, Luciano Bivar (PE), no racha que levou à saída de Bolsonaro do partido.

Ou seja, mesmo que não houvesse nenhuma dissidência nesse grupo, faltariam ainda três votos para se chegar aos 342 necessários (dois terços da Câmara).

Essa é a contabilidade formal. Na prática, há ainda substancial apoio a Bolsonaro nas siglas de centro-direita hoje independentes, como PSD e MDB. Além disso, o Podemos (10 deputados) anunciou ser contra o impeachment.

Mesmo nos partidos formalmente a favor do impeachment, há posições dúbias, principalmente após a carta de recuo.

Marcel van Hattem (RS), da bancada do Novo, que defende a saída de Bolsonaro, subiu à tribuna da Câmara na quinta-feira (9) para afirmar que estava contente em ver a tentativa do presidente de acalmar os ânimos.

“Esperamos que gestos nesse sentido sejam dados também pelo Supremo Tribunal Federal, pelos Ministros do STF”, disse Van Hattem, segundo quem alguns têm “extrapolado suas funções”.

Procurado pela Folha, o deputado afirmou não ver condições reais para o impeachment, atualmente. “O presidente da Câmara, Arthur Lira, não tem dado brecha para a possibilidade de abertura.”

ENTENDA O CAMINHO DO IMPEACHMENT DE PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Qual a situação atual?  

Mais de 130 pedidos de impeachment de Bolsonaro já foram protocolados na Câmara. Das peças que seguem em análise, a mais antiga data de 13 de março de 2019.

Onde estão as regras sobre o impeachment?

O rito do impeachment, os requisitos para apresentação de um pedido e a definição dos crimes de responsabilidade dependem de uma leitura conjunta de diferentes itens. A existência em si da possibilidade legal de retirada do presidente do cargo, por crime de responsabilidade, está prevista na Constituição. Já a definição dos crimes, assim como as normas de processo e julgamento, constam em uma lei específica, conhecida como Lei do Impeachment.

Quem pode apresentar pedidos de impeachment e quais os requisitos?  

A Lei do Impeachment define que qualquer cidadão pode denunciar o presidente da República por crime de responsabilidade perante a Câmara.

Quais são as regras sobre o recebimento dos pedidos de impeachment?  

A Constituição se reserva a determinar que é competência privativa da Câmara autorizar -por dois terços de seus membros- a instauração de processo contra o presidente.

É na Lei do Impeachment que aparece o recebimento da denúncia, que determina: “Recebida a denúncia, será lida no expediente da sessão seguinte e despachada a uma comissão especial”.

O que acontece se o presidente da Câmara recebe o pedido?

A partir do momento em que o pedido é recebido pelo presidente da Câmara, dá-se início ao rito do impeachment com a criação de uma comissão com representantes de todos os partidos. Esse colegiado é responsável por elaborar um parecer, que pode ser favorável ao prosseguimento do processo ou ao arquivamento. Aprovado o parecer, ele é então votado no plenário, sendo preciso o voto de dois terços da Câmara (342 deputados) para que o impeachment seja autorizado.

O que acontece se o presidente da Câmara não arquiva nem aceita a denúncia? Há prazo para análise?

É nesta espécie de limbo que os pedidos de impeachment de Bolsonaro se encontram. Ao criar essa etapa de verificação pelo presidente da Câmara, o regimento não estabeleceu um prazo para que ela ocorresse.

PL e PP, líderes do centrão e aliados de Bolsonaro, foram cruciais para derrota de voto impresso

A análise do mapa da votação que rejeitou nesta terça-feira (10) a adoção do voto impresso mostra que os dois principais partidos do centrão, PL e PP, foram cruciais para enterrar na Câmara a bandeira de Jair Bolsonaro, também pretexto para seus discursos golpistas.

Apesar de serem aliados do presidente da República, as duas siglas deram apenas 27 votos a favor da medida, um terço de suas bancadas. Outros 36 deputados dessas duas legendas votaram contra e 18 se ausentaram, o que, na prática, contou como voto contário à PEC.

Ou seja, se PP e PL tivessem se mobilizado totalmente a favor do voto impresso, a medida ficaria bem mais próxima de ser aprovada -em vez dos 79 votos a menos (uma PEC precisa de 308 ou mais votos), faltariam apenas 25.

O PP lidera o centrão e tem a Casa Civil, comandanda pelo presidente da sigla, o senador Ciro Nogueira. A Câmara também é presidida pelo partido, com Arthur Lira (PP-AL), que nesta terça afirmou esperar que esse assunto esteja encerrado entre os deputados.

Nos bastidores, o centrão nunca se envolveu de corpo e alma na defesa do voto impresso, considerando essa uma bandeira dos bolsonaristas radicais. Na reta final da discussão, ainda pesou contra o agravante de Bolsonaro intensificar o discurso contra os Poderes.

Em uma atitude diferente das grandes siglas do centrão, partidos que se opõem a Bolsonaro, mas não integram a esquerda, racharam, apesar do discurso público de seus presidentes contrários ao voto impresso.

Em junho, presidentes de 11 legendas se reuniram e fecharam acordo para votar contra a medida.

Nesta terça, porém, PSDB, MDB e DEM se dividiram. Os tucanos deram 14 votos a favor da medida, mais do que os que votaram contra (12). Cinco se ausentaram, e Aécio Neves (MG) foi o único a se abster, o que, na prática, contou como voto contra.

MDB e DEM deram 28 votos a favor da medida e 33 contra (entre faltosos e votos não). O PSD de Gilberto Kassab pendeu mais para o lado do voto impresso -20 votos a favor da medida e apenas 15 contra (entre votos não e faltosos).

Dirigentes partidários atribuíram boa parte dos votos favoráveis à PEC à pressão de integrantes do governo e de bolsonaristas. Segundo eles, houve forte ofensiva via redes sociais e mensagens de WhatsApp para convencer os parlamentares a aprovarem o texto.

Alguns acabaram se comprometendo nas redes sociais não quiseram voltar atrás, sob argumento de não frustrar as bases.

Segundo dirigentes partidários que trabalharam contra a bandeira bolsonarista, embora o resultado da votação não tenha sido acachapante, o fato de Bolsonaro ter pressionado pessoalmente e colocado até blindados na rua no mesmo dia da votação mostra o quanto ele foi derrotado.

O PSL, partido pelo qual se elegeu Bolsonaro, votou em peso a favor da PEC -45 contra 8 (entre “não” e faltosos). A pressão de governistas na reta final das discussões teve peso grande na bancada evangélica.

O Repúblicanos, partido ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, foi uma das siglas grandes que mais apoio deram à medida. Foram 26 votos favoráveis e apenas 3 contra e 3 faltosos. O PSC, também ligado aos evangélicos, votou fechado (11 deputados) a favor da medida.

A oposição votou contra, como era esperado, em especial PT, PSOL e PC do B. Em duas siglas desse campo, houve apoio maior ao voto impresso, no PDT e PSB.

No PDT, partido em que o voto impresso era uma bandeira histórica, apenas seis dos 25 deputados foram favoráveis à PEC. Os demais votaram contra, em resposta à polarização e à apropriação do tema pelos bolsonaristas.