O frango nosso de cada dia, com muito aroma e sabor. Duas receitas
“Em todos os pratos podemos encontrar, ao lado dos ingredientes, os elementos de uma história: um começo, um meio e um f..
“Em todos os pratos podemos encontrar, ao lado dos ingredientes, os elementos de uma história: um começo, um meio e um fim”. Esta máxima de Michael Pollan, 66 anos, jornalista, escritor e professor norte-americano, autor de obras consagradas da gastronomia, pode se aplicar muito bem a chefs que, mesmo que já transitem pela alta gastronomia, sempre preservaram suas origens. Este é o caso de Delio Canabrava, que apresenta aqui receitas de família, frango recheado e desossado e frango com polenta, dois pratos consagrados e populares, nas versões do chef (veja as receitas no final do texto).
Empresário e cozinheiro profissional formado no “chão de fábrica”, Delio, a exemplo daquele homem dos sete instrumentos, toca hoje quatro diversificados empreendimentos de alimentação, em Curitiba – Cantina do Delio, Confeitaria Banoffi, Bar Cana Benta e Torroneria Curitibana. Tudo para sobreviver naquilo que mais gosta de fazer, em épocas como a nossa de pandemia.
Respeitando os princípios de Pollan na culinária, que na realidade são filosoficamente mais amplos (tudo tem começo, meio e fim), ele tirou, dos velhos cadernos de panelas, ingredientes, fornos e fogões da família, receitas que impulsionaram a sua cantina e fazem representar a sua própria autenticidade de cozinheiro. Segredo: ingredientes simples, modos de fazer simples. Nesta linha, o frango é uma das receitas preferida dele.
“O frango é uma carne saudável, com pouca gordura, e é muito democrática e versátil. Podemos fazer muitos e muitos pratos; a carne possibilita muitos cortes. Na minha cantina, por exemplo, o que eu vendo mais é o frango à parmegiana, o frango com polenta e o frango com legumes (light)”, diz ele.
Delio não fala nenhuma novidade que outros chefs e as experientes donas de casa já não saibam. O que denota em suas observações, no entanto, é a simplicidade da cozinha que esta ave de fácil trato proporciona. Dos quintais, passando pela grande indústria ou pelas mãos de chefs estrelados, um humilde caldo e um molho pardo requintado têm os seus lugares garantidos na história.
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O abençoado caldo quente dos enfermos e de dom Pedro II
Para grande parte de populações como a do Brasil, o frango pode ser considerado um alimento de excelente custo-benefício, embora a conjuntura atual tenha salgado os seus preços, assim como de outras carnes. Além da grande quantidade de proteínas, o frango também é uma rica fonte de vitaminas. Do ponto de vista gastronômico, há um consenso de que, fora as visões elitistas, da para dizer que os pratos com frango são um dos mais saborosos da gastronomia mundial. E isso vem de muito longe.
Não é de hoje a presença nas mesas deste pequeno animal, que foi batizado, na modernidade, com o nome científico de Gallus gallus domesticus. A humanidade já conhecia as qualidades deste personagem dos quintais e terrenos baldios desde quatro milênios atrás. Ele se popularizou entre nós pelas mãos dos portugueses.
O poeta maior Luís Vaz de Camões (1524-1580), autor de “Os Lusíadas”, uma das obras mais importantes da literatura portuguesa, deixou o frango imortalizado em um de seus versos, ao mostrar o seu gosto pela cabadela: “Das lágrimas caldo faço/ Do coração escudela/ Esses olhos são panela/ Que coze bofes e baço/ Com toda a mais cabadela.” Explicando: a galinha de cabidela (variação de cabadela) é nada mais do que a galinha ao molho pardo, que é feita com o sangue do animal e aqui veio já no século XVI. Fala-se cabidela por se utilizar na receita os “cabos” da galinha, como se dizia antigamente, ou seja, os miúdos e as demais extremidades do animal. Existem muitas receitas dessa especialidade, no Brasil.
Mas não foi só Camões que exaltou as propriedades dos galináceos: o Marques de Pombal (1699-1782), que comandou com sapiência e mão-de-ferro o reino português no século XVIII, realizando reformas que tiveram grande impacto também no Brasil, baixou um decreto que instituiu a canja quente de galinha como um dos alimentos-base para os enfermos dos hospitais. Dom Pedro II (1825-1891), o último monarca do Império do Brasil, era um fiel consumidor de caldo. Fazia questão de ser visto em público, especialmente nos intervalos das apresentações teatrais, saboreando um substancioso caldo quente de galinha. Isso é apenas um bocadinho da história das receitas.
Granja de galinha orgânica em Mandirituba (PR). Foto: Diego Singh
As cifras bilionárias do frango brasileiro e o destaque do Paraná
Hoje, o frango é um dos produtos mais importantes da agroindústria brasileira e da pauta de exportações, gerando quase 4 milhões de empregos e serviços no campo e na cidade. As cifras são bilionárias e o Paraná está no centro desse processo. Em 2020, uma em cada três aves abatidas no Brasil saiu do estado. Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o Paraná produziu 35 % das 13,7 milhões de toneladas de frango do país, no ano passado.
Toledo (Oeste), município com mais de 140 mil habitantes, possui um plantel estimado de 7,5 milhões de aves de corte – o maior do estado. No conjunto, além de principal produtor, o Paraná é também o que mais exporta. Responde, na verdade, por 40,9% (2020) das exportações brasileiras, destinadas a 160 países. Mesmo com a pandemia, os produtores continuam comemorando os resultados.
É importante salientar aqui que a cadeia produtiva de frangos de corte reúne setores importantes da economia: criadores, produtores de grãos, fábricas de rações, transportadores, abatedouros e frigoríficos, além dos segmentos de máquinas, embalagens, medicamentos, distribuição e naturalmente o consumidor final. Segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), 80% da população brasileira consomem carne de frango no mínimo duas a três vezes por semana.
Por isso, haja variação de receitas para tanto consumo!
Criação de frangos em Toledo (PR). Foto: AEN Joelson Lucas
Com a palavra, o cozinheiro Delio Canabrava
“Sempre valorizei as reuniões familiares e de amigos, envolvendo comida; gosto muito de observar as pessoas e como fazem as coisas. Comecei a cozinhar para ter as pessoas perto de mim e deu certo; sempre tem gente aonde eu vou, todos querem me convidar para degustar os meus pratos e escutar minhas histórias”. Este é o Delio Canabrava. “Eu ficava olhando encantado, enquanto minha mãe fazia surgir, do nada, pratos mágicos”, conta ele.
Tendo este olhar e gosto pela comida, não foi mero acaso que, quando foi estudar Design Gráfico em Londres (Inglaterra), em 1997, tendo que ralar para viver, foi para a cozinha de um restaurante lavar pratos. “Em poucas semanas, já estava picando cebola, alho e tomates. Na sequência, me passaram para fazer molhos e saladas. Evoluí rapidamente e logo fui fazer sanduíches e pizzas, e daí para massas e carnes foi um pulinho. Em três anos, já era sub chef. Nos fins de semana, trabalhava até dezesseis horas por dia. “Mas valeu à pena, foi a melhor coisa que eu fiz”, conta.
Desde 2004, toca seus negócios de alimentos em Curitiba. Aqui ele divide as suas experiências de chef, sem esquecer o caderno de receitas de casa. Polenta e assado estão sempre presentes. Veja as receitas abaixo:
Frango desossado e recheado
Ingredientes
(4 pessoas)
1 frango de 2 kg (em média)
Para o recheio
1 cebola média picada
3 dentes de alho picados
200 g de fatias de presunto
200 g de queijo muçarela
200 g de calabresa em cubos
500 g de farinha de milho em flocos
100 g de manteiga
100 g de azeitonas verdes picadas sem caroço
100 g milho verde
Para a vinha d’alho
3 dentes de alho
1 cebola média picada grosseiramente
1 xícara de vinho branco
5 folha de louro
1 copo de água
Pimenta-do-reino
Sal a gosto
Barbante para amarrar o frango com o recheio
Preparo
Abra o frango pelo dorso com uma faca fina e bem afiada; vá tirando todos os ossos; raspe a carcaça do frango com muito cuidado para, em hipótese alguma, não furar a pele. Toda a pele servirá de recipiente para o recheio. Coloque o frango desossado na vinha d´alho, a ser feitas com os temperos da receita (alho, cebola, louro, sal, pimenta, vinho e água), por 8 horas.
Para o recheio, frite em manteiga o alho, a cebola e a calabresa e deixe esfriar. Pique o queijo e o presunto e adicione o milho. Junte a farinha em flocos, mexendo bem e temperando a gosto; deixe a farofa úmida e, se necessário, adicione um pouco da vinha d´alho que temperou o frango para equilibrar.
Abra a manta e tire os excessos de carne do peito e reposicione onde faltar carne. Coloque a carne no meio como se fosse uma massa que vai ganhar formato de salame; e comece a enrolar da ponta da ponta para o meio e amarre com o barbante, de 3 em 3 centímetros, para formar este cilindro no formato de salame. Coloque-o em uma forma com a parte das emendas e nós para baixo e passe manteiga na pele para dourar melhor. Assar em forno a 180 graus por 2 horas ou até dourar bem.
Frango com Polenta
(2 a 3 pessoas)
Polenta
ingredientes
1 litro de água
200 g fubá,
1 colher manteiga,
1 colher de chá de sal
Preparo
Ferva a água com o sal e a manteiga, acrescente o fubá mexendo bem, até dissolver toda a farinha; cozinhe por 40 minutos mexendo bem até a polenta ficar consistente. Reserve.
Frango
ingredientes
3 coxas e 3 sobrecoxas,
1 cenoura ralada
250 ml de água
1 cebola picada
1 folha de louro
300 ml de tomate pelados bem maduros
100 ml de óleo
4 dentes de alho
Pimenta-do-reino e sal a gosto
Preparo
Tempere o frango com o alho, o sal e a pimenta e deixe pelo menos 3h reservado; Aqueça bem uma panela grossa (ferro, barro ou pedra) e frite o frango até dourar; adicione os outros ingredientes e não mexa muito para não rasgar a pele.
Cozinhe por 1 h em fogo lento.
Para servir, coloque a polenta por baixo e as partes dos frangos por cima, decorando com salsinha. Aprecie a boa polenta!