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Hanseníase: pandemia faz notificações caírem 57% em 2021

Hanseníase: pandemia faz notificações caírem 57% em 2021

Até o momento, foram registrados no país 12.045 novos casos da doença, informa levantamento preliminar feito pela SBD

Agência Brasil - domingo, 30 de janeiro de 2022 - 10:18

A pandemia de covid-19 provocou, no ano passado, queda de 57% nas notificações de hanseníase no Brasil. Até o momento, foram registrados no país 12.045 novos casos da doença, informa levantamento preliminar feito pela SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia) com base em dados do Ministério da Saúde.

Segundo a médica Araci Pontes Aires, assessora do Departamento de Hanseníase da SBD, o resultado que aponta queda nas notificações da doença não considera, porém, os números totalmente fechados de 2021, que o ministério deverá divulgar somente a partir de março ou abril deste ano. Isso significa que os casos apurados em 2021 ainda poderão mudar nos próximos dois meses.

Em entrevista à Agência Brasil, Araci Aires informou que houve 28,8 mil notificações da doença em 2019 no Brasil e que, em 2020, ocorreu queda de quase 40%. “Isso é muito preocupante, pelo fato de a hanseníase ser uma doença crônica, que permanece endêmica no nosso país, com média de 28 mil casos nos últimos três anos antes da pandemia [2017, 2018, 2019]”, ressaltou a dermatologista.

Com a pandemia, houve retração nas notificações, que passaram da média de 28 mil casos, em 2019, para 18 mil casos, em 2020. “Mas isso não corresponde à realidade”, afirmou Araci. Para a médica, este é mais um dos “efeitos deletérios” da pandemia, por conta do lockdown, do medo de comparecer a uma unidade de saúde e contrair a covid-19 e até mesmo pela sobrecarga do sistema de saúde, que foi obrigado a relegar um pouco as outras doenças crônicas. “A hanseníase também sofreu isso.”

A dermatologista disse que os casos não notificados correspondem a pessoas que deveriam ter procurado as unidades de saúde para serem diagnosticadas e que permaneceram doentes, sem diagnóstico e, consequentemente, sem tratamento, “o que é grave”. Para Araci, a falta de notificações prejudica o rastreamento da doença. O Brasil é o segundo país em número de casos de hanseníase, atrás apenas da Índia, destacou a médica, lembrando que a pandemia causou grande impacto no subdiagnóstico. “Pessoas não foram diagnosticadas e permanecem doentes. Não foram sequer diagnosticados para que pudessem ser notificadas.”

JANEIRO ROXO: CAMPANHA DE CONSCIENTIZAÇÃO SOBRE A HANSENÍASE

A conscientização das pessoas sobre a hanseníase foi o tema da campanha Janeiro Roxo 2022, intitulada “Precisamos falar sobre hanseníase”. Para Araci, a campanha deveria se realizar durante todo o ano, porque a hanseníase é uma endemia que, diferentemente da dengue, por exemplo, não ocorre em um período determinado, mas durante todos os meses.

O foco da campanha da SBD é alertar a população, com informações sobre os sinais e sintomas da doença, o tratamento e o combater à questão do estigma dos portadores de hanseníase. “Em tratamento, a pessoa não transmite mais [a doença] e pode conviver normalmente com parentes, amigos e colegas no local de trabalho, sem nenhuma restrição.”

A Sociedade Brasileira de Dermatologia recomenda que a pessoa procure um posto de saúde se tiver algum sintoma da doença.

Entre os sintomas clássicos que podem alertar as pessoas para a hanseníase, a dermatologista Araci citou o aparecimento de mancha mais clara que a pele, avermelhada ou, às vezes, acastanhada, que não apresente sensibilidade normal; dormência de mãos e pés; orelha mais inchada; aparecimento de caroços pelo corpo; olhos ressecados; feridas, sangramento e ressecamento no nariz; febre e mal-estar geral. “Todos são sinais de alerta para que a pessoa busque uma unidade de saúde para confirmar se é um caso de hanseníase.”

REGIÕES NORTE E NORDESTE TÊM MAIOR ÍNDICE DE CASOS

A hanseníase é uma doença muito relacionada com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das regiões. Por isso, as regiões Norte, Nordeste e alguns estados do Centro-Oeste costumam ter maior índice maior de casos, “exatamente pelos bolsões de pobreza”. Dados da SBD revelam que o maior número de casos novos identificados na última década ocorreu na Região Nordeste (43% do total), seguida do Centro-Oeste, com 20% dos casos; Norte (19%); Sudeste (15%); e Sul (4%).

Araci Aires observou, contudo, que não se trata de uma doença exclusiva da classe social menos favorecida, pois 10% dos diagnósticos de hanseníase no país são de pessoas com nível superior de ensino. Fragilidades sociais, como habitação precária, ausência de informação e dificuldade de acesso aos sistemas de saúde, favorecem o contágio da doença. De 23.351 pessoas com hanseníase que deram informações sobre grau de ensino, 11.061 tinham ensino fundamental (47% do total); contra 8% com nível superior (1.897 pessoas).

A médica advertiu que, como qualquer doença infectocontagiosa, transmitida pelas vias aéreas, há mais facilidade de contaminação onde existem condições precárias de moradia, com famílias de muitas pessoas vivendo por vezes em um único ambiente, com pouca ventilação, o que facilita a transmissão. A hanseníase tem outro problema que é a questão do estigma. As pessoas, muitas vezes, protelam a ida ao médico porque têm medo de, ao serem diagnosticadas com essa doença, passarem a ser rejeitadas pela família, pelos amigos, no ambiente do trabalho.

PERFIL

Na maioria dos casos, o paciente notificado com hanseníase no Brasil é do sexo masculino, como se pode constatar pelos dados oficiais do Ministério da Saúde. Em 56% dos registros de 2020 e 2021 comunicados até agora os pacientes eram do sexo masculino. Quanto à idade, 53% dos registros oram de adultos com mais de 30 anos. Destes, 19,5% tinham de 40 a 49 anos; 19,2%, de 50 a 59 anos; e 14,6% , de 30 a 39 anos.

Nos últimos 11 anos, a hanseníase acometeu 342.257 pessoas no Brasil. Nesse período, a maioria dos pacientes notificados no país foram homens (55% dos casos registrados no SUS, com 189,8 mil notificações).

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