Pedro Ribeiro

Euclides Scalco. O homem, seu tempo e sua história. Com esta obra, o engenheiro e escritor, Marcos Antonio Bastiani, nos brinda com as memórias e episódios familiares curiosos, emocionantes e fraternos de um homem que deixa “herança moral” a netos e bisnetos para eu eles saibam que “lutei o bom combate” e “sou um homem feliz”, como relata em simpático recado no autógrafo. São quase 500 páginas recheadas de depoimentos, pesquisas e fotos que mostram a trajetória de um gaúcho paranaense que vai além do plano pessoal.

Recebi o livro nesta terça-feira (29), durante almoço semanal de um grupo de amigos que se reúne há mais de 30 anos e que têm, na figura do Dr. Scalco, o seu líder maior. Heinz Herwig, Antonio José Correia Ribas, Dalton Fernando, Wilson Kuster, José Alfredo Stratmann, Ney Guimarães, João Batista, Maurício Ferrantes, coronel Sergio Malucelli e este jornalista, somos privilegiados por fazermos parte dessa confraria ao lado de um dos homens mais respeitados da política paranaense e brasileira nas últimas décadas.

Meu amigo, jornalista João Arruda, que por muitos anos dirigiu a Folha de Londrina, traça um pequeno perfil da biografia de Euclides Girolamo Scalco e sua família na apresentação da obra que teve, também, a participação de outra jornalista, a também amiga, Rose Arruda.

Prefaciado pelo amigo Deni Lineu Schwartz, o livro cona com depoimentos de personalidades da vida pública e privada do Paraná e do Brasil. Na introdução, Fernando Henrique Cardoso diz que “Scalco é um homem notável”. Trata-se de um político de verdade: acredita nas causas que abraça, tem coragem, é sério e competente, relata o ex-presidente.

“Scalco exerceu a liderança da Assembleia Nacional Constituinte. Sempre com pulso firme, mantendo suas convicções, mas respeitando a opinião dos demais e sobretudo as regras. Quem decidiu a duração do mandato e a questão da forma de governo foi o Plenário da Constituinte, já então sob a influência do que se chamou de “centrão”, um agrupamento de forças com tendências variáveis, predominantemente conservadoras, mais obediente ao Palácio do Planalto do que aos líderes de partidos”, lembra FHC.

Segundo o ex-presidente, “Scalco, como sempre, estava mais próximo dos “autênticos” do MDB, do que dos mais conservadores e muito longe, portanto, do “centrão”. Correspondia assim sua origem política: católico progressista, mais tarde ligado ao PTB em sua terra de adoção – Francisco Beltrão, no Paraná. Em seguida, mantendo a independência que sempre o caracterizou, tornou-se figura de referência dos emedebistas mais sensíveis à democracia e aos anseios populares”.

“Assim foi e é Euclides Scalco: um homem notável. Independente em suas posições, é leal aos partidos a que se filia que, ao ver dele, estes se afastam das diretrizes e valores fundamentais que deveriam guiá-los. Não foi só a República que Scalco serviu, ao Paraná também, onde, além de haver sido eleito para exercer vários mandatos representativos, foi chefe da Casa Civil no governo José Richa. Foi e continua sendo referência política por suas qualidades: a lhaneza no trato não esconde a virtude de ser homem de princípios. Junta a ação prática à crença firme em seus valores, tanto em sua vida privada quanto na pública. É de líderes deste tipo que o Brasil necessita”, pontua Fernando Henrique Cardoso.

Para o ex-governador e arquiteto, Jaime Lerner, “a vida de Euclides Scalco é a trajetória notável de uma personalidade moldada por várias épocas, mas sempre pautada pela coerência de sólidos princípios”.

O também ex-governador João Elísio Ferraz de Campos diz: “…como cidadão, político e homem público, está sempre do lado certo, ou seja, do lado do que é melhor para o Brasil e os brasileiros”.

“O país no cardápio”

Com esta frase, em forma de subtítulo da obra, o autor fala sobre a confraria das terças e sextas-feiras onde Scalco é a figura principal.

“Eles são engenheiros, advogados, geólogos, políticos, empresários. Gente experimentada no serviço público em todos os níveis- como gestores, dirigentes, executivos. Scalco até ministro de Estado foi. Estão ali reunidos às terças e sextas-feiras, muitos séculos de experiência e sabedoria. A freqüência não chega a ser um compromisso, mas quem vai nem olha para o relógio”.

É esta a rotina, à mesa, que alimenta amizades de décadas entre esses ex-colegas de gestão pública e privada e ex-comandados de Scalco. Muitos, desde os tempos do d governo José Richa (1983-1986), outros, mais recentes, dos tempos em que a Itaipu teve suas finanças saneadas e bateu recorde de produção de energia, com Scalco presidente do lado brasileiro da binacional.

Todos estão aposentados, mas não abandonaram o interesse pelos rumos do Estado e do Brasil, que acompanham com não certa dose e desencanto. “Na verdade, a gente antes dedica uns dez minutos para falar de médicos, medicamentos e dores, que não poupam ninguém da nossa idade”, comenta bem-humorado José Alfredo Stratmann. Logo o bate-papo retoma seu foco de interesse geral: o cotidiano da política e da economia, com espaço também para o futebol e viagens (sonhadas ou realizadas) e boas risadas.

“A gente quer acreditar que é possível melhorar, mas desconfiamos que não vai acontecer”, comenta Dalton Fernando sobre política e votos.

Único jornalista participante do grupo das terças-feiras, Pedro Ribeiro, diz que “Scalco tem postura pensativa e só fala quando provocado, mas que suas palavras sempre são oportunas, com análises precisas sobre o cenário nacional. “Tudo o que ele diz é ensinamento para todos, que o ouvem atentamente e demonstra que sua sabedoria faz falta para o Brasil”, define.

Político como Scalco, o ex-secretário de Transportes e ex-presidente do Tribunal de Contas, Heinz Herwig, só conhece um. O próprio.

Nas reuniões de terças-feiras um momento especial: o brinde em memória do engenheiro Wilson Justus Soares (falecido em 2017) que sempre teve lugar destacado à mesa, por ser pensador centrado de também liderança do grupo.

Nestes encontros muitas vezes também éramos brindados com a presença do jornalista e amigo e Scalco, Helio Teixeira, falecido em 2015. Sempre cheio de novidades de bastidores da políticas. Um gênio na arte de escrever.

Cidadão Honoário

Eram preciso, sim, algumas palavras de agradecimento a este político que nos honrou como paranaense, embora seja gaúcho de nascimento, com seu trabalho, sua inteligência e ética ao Estado, onde se instalou em Francisco Beltrão, em 1959. Euclides Scalco, que dispenso aqui cargos que ocupou nas esferas dos governos estaduais e federal, foi agraciado nesta segunda-feira, dia 16, com o título de Cidadão Honorário do Paraná.

Uma homenagem que emocionou o protagonista da história política recente do Paraná quando, ao lado de José Richa, deram lições de gestão pública que até hoje são lembrados pela velha e nova geração de políticos.

Ontem tive certeza disso quando ouvi do veterano Ademar Traiano, presidente da Assembleia Legislativa, que Scalco o introduziu e foi sua luz na política. Mais jovem, o deputado Michelle Caputto disse que ele foi um exemplo à nova geração de políticos, com uma carreira ilibada e um articulador de respeito nacional. Ainda mais jovem, o vice-prefeito de Curitiba Eduardo Pimentel não se intimidou ao afirmar que se trata de um espelho e um mestre que contribuiu com o nosso ensinamento.

Scalco, próximo de alcançar 90 anos de idade, é um daqueles homens e políticos que deve ser consultado a todo momento sobre qualquer grande decisão que um gestor público venha a tomar para não cometer erros. Ele é um daqueles políticos que já não vemos mais no Congresso Nacional onde, hoje, não existem mais lideranças e representações que deixaram o país tateando por um novo rumo.

Hoje vivemos uma fase profunda de transição na concepção e no conceito político, uma época de formação de novas lideranças que estão para surgir mas que ainda não deram as caras.

Quando vemos e ouvimos um político do calibre ou naipe do guerreiro Euclides Scalco falando, como na homenagem desta segunda-feira, podemos dizer que o Brasil está doente e carente de estadistas e não é por culpa do governo de plantão. Nunca na nossa História estivemos tão órfãos, com angustiante expectativa do que virá pela frente, confiantes sem termos certeza, amedrontados na aposta do que nos resta de esperança, com um entusiasmo mas cheio de involuntárias dúvidas.

O país passa por profundas modificações com decisões que estão para serem tomadas e que podem alterar o modo em que vivemos e não se vê e nem se ouve uma única voz do que acreditávamos serem lideranças políticas. Elas já não se aventuram a dar opiniões ou se manifestarem a respeito. Apodreceram junto, sumiram, se esconderam, já não tem mais o que dizer, acuadas em seus fracassos e desilusões, já pouco servem como referência na formação de uma parcela que seja de opinião pública a respeito desses novos tempos.

Mesmo lideranças que se apresentavam como o novo no cenário político estão mudas, pouco aparecem, quando se manifestam é timidamente e o País continua nesse enredo confuso e desordenado. Vamos precisar de algumas décadas, talvez, para nos depararmos com políticos com formação, com lideranças genuínas e perfis de estadistas, que nos façam acreditar na possibilidade de haver um projeto nacional, uma percepção visionária de futuro que seja capaz de despertar nosso ânimo e entusiasmo. Entre estes políticos, destaco Euclides Scalco e José Richa.

O debate do novo país se dá por especialistas em áreas fragmentadas, gente que conhece determinado assunto. Não permeia mais a esfera de lideranças políticas que pudessem ter uma visão abrangente de estadista, de um projeto nacional, como se acreditava e que acabou se revelando não existirem, deixando o país nu em frente ao seu próprio espelho.

Scalco falou pouco em seu discurso no Salão Brasil da Prefeitura de Curitiba, onde recebeu a comenda em solenidade presidida pelo presidente da Assembleia Legislativa, Ademar Traiano e na presença do prefeito de Curitiba, Rafael Greca e dezenas de políticos, empresários e admiradores do farmacêutico que ganhou Brasília, ajudou a transformar o Paraná e mudou o conceito de gestão da Itaipu Binacional.

Traiano foi mais eloqüente e confessou-se emocionado ao presidir a entrega do título a um político que o inspirou a entrar na vida pública. “Eu me emocionei hoje durante a entrega de do título de Cidadão Honorário do Paraná, ao ex-deputado estadual e federal, ex-ministro e ex-diretor geral da Itaipu, Euclides Scalco. É uma justíssima homenagem a um gaúcho que se tornou um pioneiro e desbravador do Sudoeste do Paraná onde construiu uma história legendária de solidariedade ao próximo, de honradez e de ética na política. Ele foi um dos homens que me inspiraram a trilhar a vida pública e tenho um orgulho especial em ter participado dessa homenagem a um ser humano que escreveu uma história maravilhosa e que continua a ser um exemplo de dignidade e honradez”.

As contribuições de Scalco com o Estado do Paraná justificaram a honraria. Farmacêutico de formação, o homenageado ganhou destaque na política, considerado dono de uma personalidade discreta e articuladora. Scalco foi vereador, prefeito, deputado federal, diretor-geral da Itaipu Binacional, além de chefe da Casa Civil do Estado no governo de José Richa (1983-1986) e ministro-chefe da secretaria geral da presidência da República no segundo governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Ao lado de outras autoridades, é um dos fundadores do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).

A solenidade, que reuniu políticos, secretários, parlamentares e autoridades, foi marcada pela emoção. Acompanhado da esposa, Teresinha Marcolin Scalco, Euclides Scalco recordou suas contribuições com o Brasil e o Paraná, em especial com a região Sudoeste, onde o gaúcho de nascimento iniciou sua carreira política. “Sempre busquei corresponder às necessidades da população. Sinto-me honrado de receber este título do Estado que me recebeu. Hoje sou um homem feliz”.

Michele Caputo, e o prefeito de Curitiba, Rafael Greca, também destacaram a trajetória e a importância política de Scalco para o Paraná. “Acompanho a vida pública de Euclides Scalco há quase quatro décadas. É um personagem de destaque na redemocratização, aliando capacidade técnica e política”, justificou Caputo. Ele lembrou ainda as contribuições do homenageado com o sistema público de saúde. “Como deputado federal e como secretário do governo José Richa, contribuiu com a defesa do cidadão paranaense”, completou. “Ele é uma pessoa que iluminou o Paraná com desenvolvimento social. É um homem que nunca faltou ao Brasil”, ressaltou Greca.