Pedro Ribeiro
Foto: DER PR

 

“Se queres ser universal, cante sua aldeia” – Leon Tolstoi

Santin Roveda

O que pode levar um urbanista reconhecido mundialmente a planejar e projetar o futuro de uma cidade de 58 mil habitantes no sul do Paraná. Foi exatamente o que fez o arquiteto Jaime Lerner, o que nos dá a certeza que tomamos a decisão certa ao convidá-lo a pensar União da Vitória para os próximos 30 anos, com intervenções urbanísticas imediatas, que chamou de acupuntura, a proposta de criação de parques ambientais para impactar as enchentes históricas do rio Iguaçu, a criação de uma identidade urbana e a projeção de qual região e áreas em que a cidade pode crescer, se desenvolver.

Eu sempre digo que União da Vitória é uma cidade abençoada por deus, digna da qualidade de vida que oferece aos seus moradores, mas que precisava desse olhar mais sistêmico, eu diria até holístico, para graduar essa referência para outros municípios brasileiros, elevando mais a estima de quem a escolheu para seu projeto de vida e chamando a atenção de de investidores.

Nada melhor do que a escolha de Lerner que nos deixa um legado de planejamento de vida das cidades, Um dos exemplos está na criação de espaços, os chamados calçadões, que priorizaram o cidadão e que se tornaram comuns nas cidades, por este mundo afora, que prezam pela vida orgânica dos seus habitantes.

Outro exemplo está na qualificação do transporte público coletivo, novamente atendendo o usuário, com caneletas, terminais exclusivos, ônibus (os BRTs) e itinerários que diminuem a espera, integram o sistema e aumentam frequência das viagens.

Lerner já previa o adensamento das vias das cidades com intenso tráfego de veículos, o que acontece atualmente, projetando um modal mais equilibrado, mais justo socialmente e menos poluente. Lerner sempre disse que as cidades foram feitas para as pessoas e não para os carros, uma certeza hoje para todo e qualquer gestor público.

O que falar então da criação dos parques ambientais que une problemas que grassam nas cidades atualmente. Impactam e evitam as enchentes, preservam e protegem a natureza, isto muito antes desse tipo de solução torna-se, felizmente, a alternativa mais viável frente a nova realidade que se impõe às cidades frente aos alagamentos provocados pelas cheias de rios e cursos d’água que cortam os espaços urbanos.

Em Curitiba, Jaime Lerner criou seis parques. Em União da Vitória, o urbanista projetou a implantação de reservatórios de compensação de águas e parques ambientais, entre eles, o Parque do Rio Vermelho. Isso para evitar, mitigar, as enchentes provocadas pelo Rio Iguaçu que cortar a nossa cidade e que se tornou uma preocupação histórica.

Em Porto Alegre, Lerner projetou a revitalização da Orla do Guaíba, uma intervenção com mais de 55 hectares ao longo da margem do Lago Guaíba. Jaime Lerner também foi responsável por projetos de arquitetura e urbanismo em cidades como São Paulo, Rio, Recife, Salvador, Aracaju, Natal, Goiânia, Campo Grande e Niterói. Lerner foi ainda consultor em assuntos urbanos para as Nações Unidas. Em 2018, foi eleito o segundo urbanista contemporâneo mais influente do mundo pela revista norte-americana Planetizen.

Ao convidá-lo para nos ajudar a planejar União da Vitória, nas várias conversas, constatei que Jaime Lerner, além de uma ligação de décadas, teve um carinho tão especial com a nossa cidade e propôs soluções simples, além de inovadoras, de execução plausível, que respeitou o espaço urbano já traçado pelos moradores. Procurou ainda, como fez com o Teatro Paiol em Curitiba, o resgate de espaços e equipamentos históricos como a Rua da União.

As diretrizes de Lerner apontaram ainda para reestruturação do sistema viário, nova sinalização vertical e horizontal, já prevendo a acessibilidade, calçadas, circulação de veículos, a ampliação das ciclovias, propondo a criação de uma rede cicloviária ligando o centro com os principais bairros e regiões da cidade. No conjunto de propostas, previu a ampliação de perímetro urbano, o novo zoneamento da cidade com a criação de novas áreas para indústrias.

Tudo isso revela o quão importante significado de Jaime Lerner para os gestores públicos. Ao criar uma identidade para cada cidade, Lerner levou em conta a máxima de Leon Tolstoi: “cante a sua cidade, que estará cantando o mundo”. Traduzindo: ao propor, soluções praticas que qualificam a vida da sua cidade, estaremos encontrando as soluções urbanas que o mundo tanto espera. Lerner sempre será o mestre dos gestores públicos preocupados em trazer esse equilíbrio entre o crescimento das cidades e a qualidade de vida de seus moradores.

Santin Roveda é empresário e ex-prefeito de União da Vitória (2017-2020)