Pedro Ribeiro
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Mesmo com o aumento da pressão de autoridades sanitárias dos estados e municípios, o governo federal avalia que não é hora de endurecer restrições para o controle da pandemia do coronavírus que vem aumentando no país, como recomendar o isolamento social, ou reforçar a testagem no País.

O alerta somente será disparado, segundo relatos feitos ao Estadão por autoridades que acompanham as discussões, quando houver alta consistente no número de mortes.

Além do reforço na estratégia de testes, estados e municípios pedem garantias de que o custeio de leitos exclusivos para tratar pacientes da doença será renovado. A preocupação foi levada ao Ministério da Saúde em reuniões nas últimas semanas. Isso porque o estado de calamidade que garantiu mais verba para a Saúde vai até 31 de dezembro e no Orçamento de 2021 não há previsão de dinheiro extra para financiar o combate à pandemia.

De acordo com o que apurou o Estadão, o comando do ministério acompanha as curvas de casos e mortes nos Estados. Nesta semana, militares da Saúde telefonaram para secretários e fizeram perguntas sobre o crescimento de óbitos. Encerraram as conversas com a certeza de que os números mais elevados eram reflexo do represamento de dados. Algumas notificações levaram dias para entrar no cálculo da doença no Brasil, pois a rede da Saúde ficou fora do ar após ataque cibernético.

A cúpula do Ministério da Saúde adotou postura reticente na pandemia. O discurso do governo Jair Bolsonaro é de que não cabe ao ministério impor medidas para restringir a circulação de pessoas, como o fechamento de comércios e escolas, por exemplo, mas aos Estados e municípios. Na prática, a pasta nem sequer estimula este debate, mas afirma que cumpriu com a sua parte ao entregar respiradores, custear leitos e repassar recursos para compra de insumos.

O ministério, porém, abandonou metas essenciais para o controle da pandemia, como de realizar 24,2 milhões de testes PCR – considerado “padrão ouro” – no Sistema Único de Saúde (SUS) até dezembro. O produto detecta a presença do vírus nos pacientes e ajuda a estratégia de isolar infectados, quebrando cadeias de transmissão. A rede pública fez até agora apenas 4,8 milhões destes exames, ou seja, cerca de 20% do previsto.

Segundo o Estadão, a postura reticente do ministério foi evidenciada nesta quarta-feira, 19, quando uma simples mensagem nas redes sociais da pasta foi apagada por citar “isolamento social” como medida para segurar o vírus, além de reconhecer que não há vacina ou cura para a doença. Apesar de seguir a cartilha de entidades científicas e da Organização Mundial da Saúde (OMS), a publicação estava na contramão do presidente Jair Bolsonaro, que minimiza a gravidade da doença, dispensa máscara, provoca aglomerações e estimula uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19, como a hidroxicloroquina.

Para especialistas, a estratégia do ministério pode descontrolar ainda mais a pandemia no Brasil. “Será uma ação tardia, se deixar para agir após o aumento de óbitos. Este é o último dado que vai registrar alta. São semanas até se traduzir em aumento nos óbitos”, afirmou Marcelo Gomes, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e coordenador da plataforma InfoGripe.

Segundo apurou o Estadão, ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, tem dito a interlocutores que, apesar do aumento de casos em alguns locais, não espera a mesma proporção de mortes do começo da pandemia. O general afirma que é preciso observar o comportamento do “novo ciclo” da doença na Europa para compreender o possível recrudescimento da pandemia no Brasil. Ele analisa que o correto é avaliar a doença em “ciclos” em vez de “ondas”.

Pazuello também argumenta que o tratamento do coronavírus avançou, mesmo sem cura ou vacina. Na gestão do militar, a Saúde cedeu a pressões do presidente Jair Bolsonaro e passou a recomendar o uso da hidroxicloroquina, contrariando a OMS e entidades como a Sociedade Brasileira de Infectologia. (jornal O Estado de São Paulo).