Alvo da CPI da Covid, empresário amigo de Barros fez delação para pagar R$ 3 mi em troca de perdão judicial

O advogado e empresário Marcos Tolentino da Silva, que será ouvido na CPI da Covid nesta quarta-feira (1), tem um acordo..

O advogado e empresário Marcos Tolentino da Silva, que será ouvido na CPI da Covid nesta quarta-feira (1), tem um acordo de delação firmado no âmbito da Operação Ararath, em Mato Grosso, no qual se comprometeu a pagar R$ 3 milhões aos cofres públicos para obter perdão judicial.

Dessa quantia, um terço foi destinada em 2020 por um juiz federal para a construção de um laboratório de testes da Covid-19 no estado.

Tolentino, que é dono do canal de TV Rede Brasil, se tornou réu em 2016 acusado de lavagem de dinheiro em um processo que aborda a compra de vagas no Tribunal de Contas do Estado.

Em 2018, fechou um acordo homologado pela Justiça no qual o Ministério Público Federal estipulou que ele não poderia sair do país sem autorização judicial. Em 2014, um de seus endereços havia sido alvo de buscas da Polícia Federal na Ararath -ele não foi preso.

O empresário será ouvido na CPI devido à suspeita de que seja um sócio oculto da FIB Bank Garantias, empresa usada pela Precisa Medicamentos para oferecer uma carta de fiança ao Ministério da Saúde em negociação para a compra da vacina indiana Covaxin.

Reportagem da Folha em julho mostrou que o endereço da Rede Brasil de TV é o mesmo de duas empresas acionistas da FIB Bank. Tanto Tolentino quanto a FIB Bank negam a hipótese de sociedade oculta.

O empresário é amigo do deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), parlamentar aliado do presidente Jair Bolsonaro e investigado na CPI por suposta atuação na negociação de vacinas.

Na Operação Ararath, Tolentino se viu envolvido ao negociar a venda de uma retransmissora de sua TV em Cuiabá, ocorrida em 2009.

Segundo denúncia do Ministério Público Federal apresentada no processo em que ele virou réu, duas empresas dele, Paz Administradora e Benetti Prestadora de Serviços, receberam em 2009 quase R$ 3 milhões (em valores da época) pagos por firmas integrantes de um esquema de “banco clandestino” que operava no estado, alvo principal da Ararath.

Esse “banco clandestino”, segundo a acusação, fazia operações financeiras ilegalmente, como empréstimos e cobrança de juros, e era supostamente abastecido com dinheiro de desvios de recursos do estado.

O Ministério Público Federal apontou ligações do suposto esquema com os ex-governadores Silval Barbosa, hoje delator, e Blairo Maggi, este alvo de denúncia à parte, que já foi trancada na Justiça.

A acusação aponta que a quantia foi paga às empresas de Tolentino em decorrência de uma negociação financeira por uma vaga no Tribunal de Contas.

Os procuradores disseram que uma das vagas de conselheiro no órgão foi “comprada” de um membro que iria se aposentar, favorecendo Sérgio Ricardo de Almeida, ex-presidente da Assembleia Legislativa, que seria indicado para o posto.

A denúncia diz que a negociação acabou desfeita, e como forma de “devolução” do dinheiro de propina anteriormente paga por Almeida, as empresas do “banco clandestino” arcaram com a compra, para ele, da Rede Mundial de Televisão, de Tolentino.

Os procuradores afirmam que cheques de terceiros foram depositados nas contas das companhias do advogado e que isso dificultou o rastreamento dos recursos.

O empresário foi acusado de “dissimular a origem, a natureza e o destino dos valores” que passaram a circular em suas empresas e que têm origem em dinheiro obtido de forma ilícita. “O pagamento deu-se de forma que, no mínimo, causaria constrangimento ao recebedor”, escreveram os procuradores.

Em seu acordo de colaboração, o empresário disse que recebeu de Almeida cheques pré-datados emitidos por terceiros, com os quais não tinha relação comercial, como forma de pagamento pela venda da emissora. Também disse ter sofrido ameaças do conselheiro do Tribunal de Contas, que está afastado do cargo.

O processo ainda não foi sentenciado e permanece sob sigilo. Segundo a Justiça Federal, ainda está na fase de diligências, que antecede as alegações finais.

Tolentino, 56, adquiriu a partir de 2006 as emissoras que formam a Rede Brasil, a qual ele se refere como uma das maiores redes de TV do país. O canal, que passa boa parte da programação exibindo filmes e séries antigos, tem em seu time de apresentadores o ex-senador Magno Malta (PL-ES) e o deputado federal Alexandre Frota (PSDB-SP).

Na TV, o empresário já foi jurado do programa de Raul Gil e, como advogado, tem atuação com compra e venda de precatórios judiciais. Na política, ele é filiado ao partido Patriota em Minas e chegou a se lançar candidato à Câmara dos Deputados em 2014, mas desistiu.

Além de Ricardo Barros, outro político com o qual tem proximidade é o deputado federal Celso Russomanno (Republicanos-SP), ex-candidato a prefeito de São Paulo.

Os dois são sócios, e o político já dirigiu o conselho de administração da emissora e apresentou programas na Rede Brasil.

Em 2016, a Folha mostrou que Russomanno possuía um helicóptero em sociedade com a empresa Paz Administradora de Ativos, que pertence à mulher de Tolentino, Vanessa.

Empresário alega segredo de Justiça e não comenta A reportagem procurou Marcos Tolentino para falar sobre a sua colaboração em Mato Grosso. O empresário respondeu apenas: ” corre em segredo de Justiça portanto sem a possibilidade de qualquer informação ou comentário de minha parte”.

Em contato com a Folha em 2020, ele havia afirmado que cooperou com o Ministério Público Federal “para a correta eludicação dos fatos”.

Disse, na ocasião, que o comprador da emissora de TV havia quitado o negócio com valores “com vícios de origem”, que em nada o envolviam. Também afirmou que buscaria reparação indenizatória pelo prejuízo na esfera cível.

À Justiça Sérgio Ricardo de Almeida tem negado as suspeitas e ainda acusado o empresário de manipulação. Afirma que o delator usou documentos falsos para justificar milhões que chegaram às contas das empresas.

ENTENDA A OPRAÇÃO ARARATH

Frequentemente comparada com a Lava Jato, a Operação Ararath foi deflagrada em 2013 em Mato Grosso, tendo inicialmente como foco a atividade de “bancos clandestinos” (empresas que emprestavam dinheiro sem ter autorização para isso). Assim como a operação originada no Paraná, a partir de delações seu campo de apuração foi sendo ampliado, atingindo elos com negócios públicos do estado.

Uma força-tarefa no Ministério Público Federal foi formada para trabalhar nos casos em 2014. Autoridades do estado, como os ex-governadores Blairo Maggi e Silval Barbosa, ex-secretários estaduais e o atual prefeito de Cuiabá, EmanuelMedicamento pediu a Elcio Franco, então número dois da Saúde, que pagamento fosse internacional, em dólar, a partir de in Pinheiro (MDB), também sofreram acusações.