Brasil evita criticas à Rússia em reunião sobre ataque à usina nuclear na Ucrânia

O Conselho de Segurança é o único órgão da ONU com poder para intervir em conflitos internacionais, como aplicar sanções ou enviar missões de paz

Em reunião emergencial do Conselho de Segurança, o Brasil evitou críticas diretas à Rússia pelo incêndio na maior usina nuclear da Europa, ocorrido em meio à invasão russa do país, e pediu por moderação entre os dois lados.

“O Brasil chama todas as partes para se absterem de qualquer medida ou ação que possa por em risco a segurança de materiais nucleares, assim como a operação segura de todas as instalações nucleares da Ucrânia”, disse Ronaldo Costa Filho, representante brasileiro na ONU.

“Parece que não importa quantas reuniões públicas façamos, o cessar-fogo e o fim das hostilidades permanecem como ilusão. O Brasil chama a todos os membros aqui a se engajar verdadeira e ativamente para promover o diálogo e construir confiança. Esta não é hora para escalar mais a retórica, mas para se engajar em conversas na direção da paz”, defendeu o embaixador.

Na noite de quinta (3), segundo o governo ucraniano, forças russas atacaram e tomaram o controle da usina nuclear de Zaporizhzhia, na Ucrânia. Houve um incêndio em um dos prédios durante o ataque, que foi controlado. Ao menos três soldados ucranianos morreram e dois ficaram feridos em decorrência da ação, de acordo com a agência nuclear do país.

A Rússia nega ter atacado o local. O representante russo na ONU, Vasili Nebenzia culpou sabotadores ucranianos pelo incêndio. Segundo ele, a região da usina já estava sob controle de militares russos desde segunda (28). Nebenzia disse que, na quinta, um grupo de nacionalistas teria atacado uma patrulha russa perto da usina, o que gerou uma troca de tiros e o incêndio em um dos prédios do complexo. Ele disse que a situação foi controlada e que não há risco de vazamento de material nuclear.

“A segurança das instalações está sendo garantida de forma conjunta entre as Forças Armadas russas e operadores ucranianos das instalações. Nossos militares não estão interferindo no trabalho dos operadores das usinas. Eles se limitam a garantir a segurança”, afirmou. Nebenzia disse que as acusações de que a Rússia teria atacado a usina é parte de “uma campanha sem precedentes de mentiras e desinformação contra a Rússia”.

Reunião emergencial do Conselho de Segurança

A reunião do Conselho de Segurança começou por volta de 11h40 em Nova York (13h40 em Brasília). No começo do evento, a Rosemary DiCarlo, subsecretária-geral da ONU, apontou que atacar usinas nucleares de energia vai contra a lei internacional, especificamente contra o artigo 56 da Convenção de Genebra.

“Operações militares em áreas nucleares e outras infraestruturas civis importantes não são apenas inaceitáveis, mas também irresponsáveis”, disse.

“De um ponto de vista técnico, a operação continua normalmente, embora obviamente não haja normalidade em uma situação em que forças militares estão no comando da instalação”, disse Rafael Mariano Grossi, diretor da IAEA (Agência Internacional de Energia Atômica), ao CS. Ele participou da reunião por chamada de vídeo.

“Escapamos por pouco de um desastre noite passada. Putin tem que parar esta loucura e ele deve parar isso agora. Forças russas estão agora a 20 milhas da segunda maior instalação nuclear da Ucrânia. Então o perigo iminente continua”, alertou a representante dos EUA na ONU, Linda Thomas-Greenfield.

Zaporizhzhia, construída entre 1985 e 1989, é o maior complexo do tipo na Europa. Tem seis reatores que produzem 5,7 gigawatts, o suficiente para alimentar 4 milhões de casas, e gera cerca de 25% da energia ucraniana, o que também a torna um ativo central para qualquer força invasora. Além disso, sua localização tem importância estratégica para a Rússia, por estar a cerca de 200 km da Crimeia, anexada por Moscou em 2014.

O Conselho de Segurança é o único órgão da ONU com poder para intervir em conflitos internacionais, como aplicar sanções ou enviar missões de paz. Essa instância é formada por 15 países, cinco dos quais com assentos permanentes e com poder de veto e outros dez em vagas rotativas – o Brasil atualmente ocupa uma posição temporária. Como a Rússia é membro fixo, pode barrar medidas contra si mesma, o que aliás já fez nesse conflito.

Na quarta (2), a Assembleia-Geral da ONU aprovou uma resolução condenando a invasão da Ucrânia pela Rússia, por 141 votos a favor e 5 contra. O Brasil votou a favor da moção, mas fez ressalvas.

“A resolução não vai longe o suficiente em ressaltar que o fim das hostilidades é só um primeiro passo para atingir a paz. A resolução não pode ser vista como permissiva em relação à aplicação indiscriminada de sanções e ao envio de armas. Essas iniciativas não são condizentes com a retomada do diálogo diplomático construtivo. E geram risco de maior escalada das tensões, com consequências imprevisíveis”, disse o embaixador Costa Filho, naquela ocasião.