Foto: Cleverson Beje/FAEP

Eleição na Venezuela não será livre, mas não precisamos entregá-la de bandeja, diz opositor

O opositor venezuelano Freddy Guevara, 35, já foi privado de sua liberdade duas vezes. Na primeira, passou três anos com..

O opositor venezuelano Freddy Guevara, 35, já foi privado de sua liberdade duas vezes. Na primeira, passou três anos como refugiado na embaixada do Chile em Caracas por participar da campanha contra a eleição da Assembleia Constituinte de 2017.

Depois, ficou detido por um mês e meio no temido Helicoide, prédio de arquitetura vanguardista na capital planejado para ser uma central telefônica e depois um shopping center e hoje convertido em prisão política de adversários do regime de Nicolás Maduro.

Enfrentando as sequelas desses períodos, entre as quais uma arritmia cardíaca, Guevara passou a integrar a equipe da oposição nas negociações com a ditadura que vinham ocorrendo no México.

A passos lentos, as conversas caminhavam para a quarta rodada quando o chavismo resolveu interrompê-las devido à extradição do empresário colombiano aliado do chavismo Alex Saab aos Estados Unidos.

Guevara foi o deputado mais bem votado na disputa por uma cadeira na Assembleia Nacional em 2015, quando foi realizado o último pleito considerado livre no país. Lançou-se na política em 2007, durante os protestos estudantis contra a estatização dos meios de comunicação por Hugo Chávez (1954-2013).

De Caracas, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo por telefone, ele comentou o caso Saab e explicou por que a oposição desconfia da observação da União Europeia nas eleições programadas para 21 de novembro.

Como o senhor interpreta a reação do regime de Nicolás Maduro à extradição de Alex Saab aos EUA?

Freddy Guevara – Suspender as negociações com a oposição devido ao caso Saab mostra que, para a ditadura, não há nenhum interesse em resolver os problemas da Venezuela. Na mesa do México estamos debatendo saúde, crise humanitária, vacinas e tratamento para a Covid, e eles se retiram porque um de seus parceiros de gangue foi preso.

Ou seja, essas questões urgentes dos venezuelanos importam muito pouco para eles. Fica claro que só estão nas negociações porque, assim, podem tentar se livrar dos delitos que cometeram. Como viram que a Justiça vai por outro caminho, decidiram levantar-se da mesa.

As negociações foram interrompidas, mas houve avanço em relação a temas de saúde, de resposta à pandemia. Algo do que já foi acertado poderia ser implementado?

FG – Infelizmente não, porque a formação das mesas sanitárias –que teriam integrantes das distintas forças políticas para planejar soluções– não foram estabelecidas. Nós as formalizamos no encontro, mas não as organizamos. Então nem para isso levar tudo ao parente preso.

Se os parentes não levam comida, ele não come; se não levam roupa nova, não se troca. A ideia de participar das eleições tem a ver com a possibilidade de dar visibilidade a essa causa dos presos políticos, que acaba sendo esquecida, quando na verdade se mostra uma situação que está se deteriorando.

O que acha que Saab poderia revelar sobre o regime?

FG – Creio que ele confirmaria nossas acusações sobre os negócios ilícitos do chavismo. Era o homem que lavava dinheiro de negócios ilegais de mineração e de narcotráfico, entre outras coisas. Tudo sob esse disfarce, de que seria um empresário que trabalharia por mais moradias e melhores cestas básicas para a população.

Ele é muito próximo de Maduro e sabe como operam todos eles. Se ele decidir falar, por meio de uma delação ou de uma confissão, então os funcionários da ditadura irão se complicar muito ante a Justiça e a comunidade internacional.

Raio-X: Freddy Guevara, 35 Nascido em 3 de abril de 1986, em Puerto de La Cruz, estudou direito na Universidade Católica Andrés Bello e foi o deputado mais votado nas eleições legislativas de 2015. É um dos fundadores do partido Voluntad Popular, ao lado de Leopoldo López. Nos últimos anos, atuou como braço direito de Juan Guaidó e, desde sua mais recente soltura, integra a comissão da oposição nas negociações com a ditadura, que ocorrem no México e são mediadas pela Noruega