Pedro Ribeiro

*Julio Cardozo

 

Pode soar estranho, mas é um fato: apesar de 2020 ter sido um dos anos mais desafiadores para a economia, o que observamos no fechamento do ano passado e início deste é um índice de inadimplência baixo. E ainda que este indicador possa mostrar alguma elevação no decorrer de 2021, salvo alguma intempérie de mercado, parece que ficaremos em patamares administráveis durante o ano.

Dados do Banco Central do Brasil mostram que as dívidas com atraso acima de 90 dias, o popular over 90, caíram para o menor patamar quando considerada a série histórica desde dezembro de 2016, época em que a inadimplência era de 4%, e outubro de 2020, mês em que estava em 2,4%.

É um dado surpreendente se considerarmos o salto no desemprego e a redução na renda do brasileiro durante a pandemia. Este fenômeno pode ser entendido, portanto, como resultado de uma série de ações por parte do governo – um trabalho junto às instituições financeiras para não deixar o crédito secar na economia com a utilização de recursos do tesouro e BNDES, um aumento emergencial de margens de capital para as instituições terem fôlego para emprestar e também rolar operações de crédito, entre outras. De fato, uma importante revista internacional reconheceu o presidente do Banco Central do Brasil como o melhor na categoria Américas e global em 2020, justamente devido à rápida e eficiente resposta dada durante a crise.

Outro fator que interferiu de maneira significativa neste cenário foi o auxílio emergencial, que ajudou diversas famílias a manter as contas em dia, considerando, por exemplo, os boletos de energia elétrica e água. De acordo com a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (PEIC), produzida pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), a quantidade de famílias brasileiras com dívidas diminuiu pelo terceiro mês consecutivo em novembro, alcançando o menor nível em oito meses. O percentual das que relataram endividamento (cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, crédito consignado, empréstimo pessoal, prestação de carro e de casa) alcançou 66% em novembro, a mesma proporção de fevereiro de 2020, anterior à pandemia.

Ainda que as rolagens de dívidas por parte das instituições financeiras e os auxílios do governo tenham prazo de validade, as expectativas podem se manter otimistas. Indicadores têm mostrado que a recuperação da economia irá ocorrer de maneira mais robusta em 2021. Mesmo havendo incertezas quanto à sustentabilidade dos efeitos das medidas mencionadas acima no médio prazo, é importante considerarmos o papel fundamental do crédito no desenvolvimento de economias locais. Os maiores desafios daqui para a frente, como tem sido amplamente discutido, são as reformas econômicas, a resposta à pandemia e a sustentabilidade fiscal das contas públicas.

Cooperativismo de crédito

É importante que instituições financeiras continuem ampliando o acesso a recursos a custos acessíveis, bem como possibilitem o prolongamento de prazos de vencimentos. Neste contexto, o cooperativismo de crédito mostra seu potencial de fazer a diferença, apresentando-se como um importante motor da economia.

A cultura da cooperação, embasada na corresponsabilidade, é um exemplo de como isso pode ocorrer de maneira controlada. Uma vez dono do negócio, cada associado é responsável pela sustentabilidade e direcionamento da cooperativa de crédito. Consequentemente, há uma preocupação maior para manter os resultados equilibrados, o que é feito por meio de um conjunto de ações que visam a manutenção da qualidade da carteira de crédito, garantindo menores riscos e um controle de inadimplência mesmo diante de um cenário econômico desafiador. Nas cooperativas de crédito, existe uma menor assimetria de informações entre o associado e a instituição, e é essa proximidade que permite um maior crescimento de carteira com maior sustentabilidade.

Também é importante ressaltar que, tanto em cooperativas de crédito quanto em instituições financeiras mais tradicionais, a evolução digital tem favorecido os modelos de crédito adotados. Munidas de ferramentas tecnológicas para coleta, gestão e análise de informações, essas organizações vêm aumentando sua capacidade de controle de riscos e eficiência de seus programas de concessão de recursos.

Todos esses fatores somados criam um ambiente favorável ao mercado de crédito para os meses que estão por vir, de modo que ele possa evoluir em condições nas quais os índices de inadimplência, mesmo com pequenas elevações, permaneçam sob controle.

 

* Julio Cardozo é diretor executivo de Riscos do Banco Cooperativo Sicredi