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Invasões e Reforma Agrágia: entenda crise entre Lula e o MST

Invasões e Reforma Agrágia: entenda crise entre Lula e o MST

O presidente e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra têm uma relação histórica, em geral de aliança, mas também recheada de atritos.

Folhapress - sábado, 22 de abril de 2023 - 10:15

O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) iniciou nesta semana a Jornada Nacional de Luta pela Terra e pela Reforma Agrária com a invasão de ao menos nove fazendas, incluindo uma área que pertence à Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), além de sedes do Incra em ao menos sete unidades da federação.

As ações provocaram reações não apenas do agronegócio, mas também do próprio governo Lula (PT)

O presidente e o MST têm uma relação histórica, em geral de aliança, mas também recheada de atritos. No meio de seu segundo mandato (2007-2010), por exemplo, Lula foi chamado por eles de “traidor”. A relação depois ganhou peso com o apoio dos sem-terra a Lula na Lava Jato e nas eleições de 2022.

Entenda em 10 pontos a crise atual entre governo e movimento dos sem-terra.

1) Qual o objetivo do MST com essas ações?

O movimento pressiona o governo Lula a apresentar um plano de ações de reforma agrária para os próximos quatro anos e atender a demanda das famílias acampadas e assentadas. O MST está insatisfeito com a lentidão da gestão federal com o tema.

A entidade estima que cerca de 100 mil famílias vivem em acampamentos no Brasil. Destas, 30 mil estão em áreas em processo de regularização que não foram concluídos pelo IncraNas conversas com o governo, o MST argumenta que é papel do movimento pressionar para que a reforma seja uma prioridade de fato do Executivo.

2) Quais ações mais irritaram o governo?

Especialmente as ações em propriedades da empresa Suzano, na Bahia e no Espírito Santo, e em terras em que a Embrapa realiza experimentos, em Pernambuco. O movimento diz que são latifúndios improdutivos.

3) Como Lula reagiu?

A onda de invasões irritou o presidente. Ele teme que as ações causem desgaste para o governo, principalmente com o agronegócio. Há receio também de que esse movimento atrapalhe o andamento de pautas de interesse da gestão Lula no Congresso.

Na prática, porém, o governo tem dado sinais de ceder à pressão As nomeações de novos superintendentes locais do Incra ganharam tração nos últimos dias após uma série de invasões e protestos liderados pelo MST.

Ao todo, foram trocados os comandos do Incra em 19 estados, além do Distrito Federal. Permanecem sem mudanças as chefias de Minas Gerais, Amazonas, Alagoas, Tocantins, Rondônia, Roraima e Amapá.

Na última segunda-feira, o movimento havia cobrado o governo Lula que nomeasse “pessoas comprometidas com a reforma agrária nas superintendências regionais do Incra”, substituindo pessoas que haviam ocupado os cargos de chefia no governo Jair Bolsonaro (PL).

4) E o PT?

Lideranças petistas afirmam que o MST sempre foi um parceiro importante do partido, mas reclamam nos bastidores da postura adotada desde o início do terceiro governo Lula.

A avaliação é a de que o Executivo tem enfrentado uma série de desafios, como no caso da invasão nas sedes dos três Poderes em 8 de janeiro e que não seria correto um aliado abrir uma nova frente de crise.

5) De quando é o MST?

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra foi criado em 20 de janeiro de 1984 e, um ano depois, no primeiro congresso dos sem-terra, elegeu a sua primeira direção nacionalEsse primeiro comando dos sem-terra se formou com 18 homens e 2 mulheres. Eles e elas representavam os dez Estados nos quais o movimento estava organizado (RS, SC, PR, MS, SP, RJ, MG, ES, BA e RO).

6) Por que o MST costuma realizar mobilizações em abril?

As invasões no mês de abril marcam o aniversário do massacre de Eldorado do Carajás, quando, em 16 de abril de 1996, 19 trabalhadores sem-terra foram mortos por tropas da Polícia Militar do Pará. O massacre é um símbolo nacional e internacional de impunidade, e as ações dos sem-terra desde então passaram a ser chamadas de “abril vermelho”.

7) Lula tem dívida com o MST?

Sim. O presidente carrega um histórico de promessas de que faria a reforma agrária na marra e na “canetada”. Nunca fez. Em seus dois mandatos anteriores fez um programa simplista de desapropriar terras a esmo, criando assentamentos sem infraestrutura e longe das bases acampadas do MST.

Lula, por exemplo, nunca cumpriu a promessa de atualizar os índices agropecuários usados para medir a produtividade de fazendas passíveis de desapropriação para a reforma agrária.

Além disso, Lula tem uma dívida política com os sem-terra. Foram eles que ajudaram a liderar as mobilizações a favor do presidente no auge da Lava Jato e no período em que ele ficou preso na Polícia Federal de Curitiba. O MST também mobilizou suas bases para a campanha eleitoral do ano passado.

8) Qual o efeito prático das recentes ações do MST?

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, afirmou à coluna Painel, da Folha de S.Paulo, que uma das demandas do MST, um plano nacional de reforma agrária, estava na mesa de Lula, mas invasões promovidas nas últimas semanas geraram tensão e impossibilitaram o anúncio.

9) O que diz o MST sobre as invasões?

Em nota, o MST defendeu a reforma agrária e destacou a urgência de investimento para agricultura familiar e acesso a crédito para a produção de mais alimentos

Na avaliação de Ceres Hadich, da direção nacional do MST, as ações são um instrumento de pressão pela reforma agrária e de denúncia contra a violências no campo. “O Brasil é o país do latifúndio, com o maior índice de concentração de terras. A reforma agrária é uma dívida histórica com os povos do campo.”

Um dos objetivos é evitar que o agronegócio vença o debate e tenha prioridade nas políticas públicas do Palácio do Planalto em detrimento das ações de redistribuição fundiária.

10) E qual a reação do agronegócio?

Na semana passada, por exemplo, a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) protocolou no STF (Supremo Tribunal Federal) uma liminar para impedir invasões de propriedades rurais em todo o país.

“Inaceitável! Sempre defendi que o trabalhador vocacionado tenha direito à terra. Mas à terra que lhe é de direito!”, escreveu o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, em suas redes, na segunda-feira (17).

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