(Foto: Geraldo Bubniak/AGB)

Medicina da palavra certa é receita do médico Sperandio

Por Aroldo MuráProsseguindo a abordagem de revistas paranaenses, tendo analisado algumas do século 20, o site/blo..

Por Aroldo Murá

Prosseguindo a abordagem de revistas paranaenses, tendo analisado algumas do século 20, o site/blog lança seu olhar agora a publicações impressas atuais, persistentes, que resistem à “fúria” digital. Marcam-se por qualidade editorial. Caso da revista Iátrico. Proximamente, outras serão mostradas.

 

Quando o geriatra e notável (desculpas pelo adjetivo, um “erro” em jornalismo) Carlos Augusto Sperandio Junior me entregou neste mês de março dois exemplares da revista Iátrico, editada pelo Conselho Regional de Medicina do Paraná, ouvi dele um pedido, que interpretei como deferência a mim: – Leia, dê—me sua opinião, diga o que achou da revista…Carlos Augusto, alguém que deve andar lá pelo final dos 40 anos de idade, parece ter nascido geriatra.

O que não lhe tira o mérito de ser incansável estudioso dessa área cada vez mais requisitada numa sociedade marcada pela senectude. Uma de suas evidentes qualidades é a rápida empatia que estabelece a com seu “rebanho”, senhores e senhoras da chamada terceira idade. Ou quarta? Na conversa fácil e derrubadora de barreiras eventuais, não tem igual, não há páreo à vista para Carlos Augusto.

PALAVRITE”

Só depois, ao ler a revista e ao artigo “Palavrite”, que Sperandio assina no número 38 da publicação (cujo jornalista responsável é Hernani Vieira, a quem ajudei a se iniciar no jornalismo) é que fui entender melhor a “chave” desse médico: ele acredita que o paciente deve ser o centro de todas as questões. O paciente, não a doença. E a palavra, o ponto de partida e remédio final para quase todas as patologias. Quase todas, é claro, sem jamais dispensar o fundamental de uma boa anamnese e os exames de toda ordem. Isso sem contar o acervo de realidades que os pacientes lhe vão passando sobre suas reais e/ou imaginárias patologia

Enfim, entendo que o bom resultado da arte médica, como a de Carlos Augusto, está muito associado ao saber manejar a psicologia do paciente, sendo o médico alguém que deve obrigatoriamente dominar o universo do Inconscientes e seus múltiplos talentos. Um pouco de leitura de Freud, Stekel, Adler não faz mal a ninguém…

Sperandio vai longe, na crônica, ao expor, por exemplo, seu Chico, 96 anos, um militar nordestino, morador em São José dos Pinhais, bom exemplo de quem sempre se abriu à Medicina e com ela dialogou, sem meias palavras, na simplicidade dos que engrandecem o ser humano por suas vidas.

No jovem nonagenário, Sperandio como que confirmou, mais uma vez, a certeza de que a Palavra tem poder. Um poder quase religioso, acelerador de esperanças e gerador de metamorfoses. Para mim, essa dissertação em forma de crônica que Carlos Augusto Sperandio expõe confirma velhas suspeitas minhas.

Algumas delas formadas a partir da minha infância, com 6 ou 7 anos, quando, com meus pais, era atendido no consultório de um dos “deuses” de minha histórica São Francisco de Assis, RS, pelo doutor Fábio Telles Touren.

FAZ TUDO E PERIPATÉTICO

Nada mais me impressionava naquele cavalheiro cinqüentão, Doutor Fábio, socorro da cidade toda, da qual era clínico geral (e coloca geral nisso) e também cirurgião que trabalhava apenas com o avanço tecnológico disponível, um Raio X. Não havia SUS, nem plano de saúde, mas todos eram atendidos. O que incluía pobres absolutos. Doutor Fábio Touren comigo não conversava.

O tempo que tinha ia gastando com meus pais, contando causos, puxando prosa, tudo envolto por uma nuvem de fumaça do palheiro que até então não era associado a câncer, anátema que só nos anos 1960 se consolidou.

Esse “deus” de minha infância por vezes me parecia – com meu olhar de hoje – alguém da escola peripatética: ia falando, prescrevendo comportamentos e providências, enquanto caminhava na ampla sala do consultório. Dava a impressão de contar os passos para acentuar, nas paradas ocasionais, recomendações que queria esclarecer aos meus pais.

Mas voltermos ao o foco, Sperandio, e a revista Iátrico. Ele traz à cena, a propósito da palavrite, uma das lendas (que conheci) da Medicina Paranaense, o médico Mário de Abreu, generalista e cirurgião, para quem a receita básica do esculápio deveria ser a escuta, a empatia e a esperança. A revista revela um universo insuspeito de certos especialistas em outras artes, além da Medicina.

Uma delas, a dos cultores da Cerveja, reunidos na Orthobier, fundada pelo doutor Sobânia, referencial da ortopedia no Paraná. Precisaria de mais espaço e tempo para transitar pela revista Iátrico, que reserva páginas especiais para falar de livros e cinema em material assinado por médicos que conhecem desse riscado.

Mas o que mais me chamou a atenção foi a reportagem “A arte de cartunista para homenagear nossos heróis”, com duas páginas mostrando a fantástica obra do iraniano Alireza Pardel, uma mestre insuperável do cartoon que ganhou o respeito do mundo por expor com traços únicos o dia a dia de um médico em suas múltiplas ações.

Aroldo Murá

 

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